Aleteia logoAleteia logoAleteia
Sábado 20 Abril |
Aleteia logo
Religião
separateurCreated with Sketch.

A Ordem Premonstratense nos seus 901 anos de existência

Religioso com terço na mão

Grenar | Shutterstock

Dom Orani João Tempesta - publicado em 19/02/23

O nascimento de São Norberto foi acompanhado por uma voz misteriosa propondo um futuro brilhante para o recém-nascido, um anjo anuncia: ‘Coragem, teu filho terá um futuro brilhante!’”

Na noite de Natal de 1121, São Norberto fundou, na floresta de Coucy, em Premontré, França, a Ordem dos Cônegos Regulares Premonstratenses ou, de modo simplificado, a Ordem Premonstratense que completa, agora, em 2022, 901 anos de fecunda existência. Neste artigo – a partir da oportuna obra “São Norberto: o defensor da Eucaristia”, do Cônego Godofredo Chantrain, O. Praem., (Cultor de Livros, 2022) – fazemos memória do Fundador e de sua Ordem que, desde 1896, se encontra também no Brasil.

Norberto, o futuro fundador, bispo e santo, nasceu no ano de 1080, no castelo de Gennep, hoje sul da Holanda. Era filho do casal Heribert e Hedwig. “Conforme a opinião da época a respeito da biografia dos santos, era necessário que certos fatos de suas vidas fossem acompanhados por inspiração divina. Assim, o nascimento de Norberto foi acompanhado por uma voz misteriosa propondo um futuro brilhante para o recém-nascido, um anjo anuncia a Hedwig: ‘Coragem, teu filho terá um futuro brilhante!’” (p. 17).

Depois de uma vida estudiosa, educada e politizada, mas também mundana, um fato providencial levou Norberto à verdadeira conversão. Em maio de 1115, “após ser atingido por um raio, durante uma tempestade, cai ao chão e ouve uma voz que o repreendia dizendo: ‘Deixa o mal e faze o bem’. Voltando em si, meditando, regressou para a casa animado. Convertido, começa a usar cilício por debaixo das vestes. No mesmo ano, Norberto se apresentou ao Príncipe-Arcebispo de Colônia para ser ordenado presbítero. No mês de setembro do mesmo ano, ele foi ordenado presbítero de Deus e se retirou, na abadia Beneditina de Siegberg, a fim de fazer um retiro de quarenta dias” (p. 18). A partir de então, não obstante as perseguições enfrentadas ou as incompreensões sofridas, até mesmo – e principalmente – por parte de alguns que deveriam apoiá-lo, o homem de Deus colocou a mão no arado e não olhou mais para traz (cf. Lc 9,62).

Depois de, como Jesus em sua vida oculta de Nazaré, passar, por circunstâncias adversas, vários anos numa pequena ermida, estudando a Sagrada Escritura e fazendo penitência, Norberto se torna pregador itinerante. Primeiro, por conta própria, como parecia ser um tanto comum na época. Depois, com o aval do Papa. Sim, “a pé, ele percorreu a Europa a fim de encontrar-se com o Papa Gelásio II, no sul da França, a quem pediu o mandato de pregar em toda a Europa. Munido da carta pontifícia, Norberto percorreu a França toda, encontrando um companheiro fiel na pessoa de Hugo de Fosses. Onde chegou, Norberto reconciliou homens e mulheres que viviam em pé de guerra, converteu os pecadores e convenceu os agiotas a cessar a sua vergonhosa exploração. Agindo assim, Norberto se apresentava como ‘Anjo de Paz’, que será uma das suas virtudes características, tanto na sua conveniência com o povo simples, como nas altas esferas da nobreza e dos governantes da Igreja” (p. 19-20).

Atendendo a um apelo da Igreja de seu tempo, o santo funda a sua Ordem, conforme podemos ler, com detalhes, na obra que estamos seguindo: “Após muitas hesitações, Norberto escolheu a floresta de Coucy, onde construiu um convento muito simples. O lugarejo era chamado Premontré. Daí que os discípulos de Norberto foram chamados, mais tarde, de Premonstratenses. O nome do lugar deu o nome à Ordem religiosa. No dia de Natal de 1121, Norberto e seus discípulos se entregaram ao serviço de Deus e dos irmãos pelos três votos religiosos: obediência, celibato consagrado e pobreza. Adotou-se a regra de Santo Agostinho como inspiração básica para a vida comum dos religiosos. Norberto e seus discípulos vestiam uma túnica de lã branca, por ser um tecido incolor e mais simples; seria um sinal de pobreza. Há uma tradição a narrar que seria Nossa Senhora quem, numa visão, lhe teria entregado o hábito branco. Redigiram-se as Estatutos que deram maior consistência à vida e ao trabalho dos Premonstratenses. O grupo de padres que rezava e trabalhava em Premontré atraiu novos discípulos. Outros conventos foram fundados na França, nos Países Baixos e na Alemanha. Norberto abriu também suas fundações para leigos, tanto homens como mulheres. Assim, vimos nascer vários conventos de Irmãs (A Segunda Ordem), que, no início, se apoiavam nos conventos masculinos, mas, mais tarde, foram construídos em lugares afastados dos conventos masculinos, conforme as leis vigentes na Igreja. Também a Ordem Terceira – leigos que viviam no mundo o espírito de Premontré – se espalhou pelas regiões da Europa” (p. 21-23).

A partir dessa bela constatação histórica e rica de simbolismo teológico, o Santo Padre, o Papa Francisco, pôde lembrar aos premonstratenses o seguinte: “A primeira profissão de Norberto e dos seus discípulos, no dia do Santo Natal, liga para sempre a vossa Ordem ao Mistério da Encarnação. Que a simplicidade e a pobreza de Belém vos inspirem o sentido de fraternidade humana. Que a presença materna de Maria Santíssima vos guie no caminho da fé e da caridade atenciosa. A sua oração com os discípulos acompanhou o nascimento da Igreja apostólica, que desde sempre inspirou o vosso modo de viver. Possa a Mãe de Cristo e da Igreja ajudar-nos a tornar-nos plenamente humanos, para sermos testemunhas credíveis do Evangelho da salvação” (Discurso aos Cônegos Regulares Premonstratenses por ocasião do IX Centenário da fundação da Abadia de Premontré, 22/09/2022).

No ano de 1126, o fundador dos premonstratenses, foi nomeado arcebispo de Magdeburgo, na Alemanha. Aí muito sofreu por implantar uma disciplina séria ao clero e fazer os aproveitadores inescrupulosos devolverem à arquidiocese o que dela tinham tirado de modo ilícito. Foi perseguido e teve, por algum tempo, de fugir da cidade. Já com sua nobre missão cumprida, no entanto, “enfraquecido pela doença, Norberto voltou à sua arquidiocese de Magdeburgo no início do ano de 1134. No dia 6 de junho de 1134, ele entregou sua alma a Deus e o seu corpo foi enterrado na igreja da Colegiada de Santa Maria, junto aos irmãos de hábito em Magdeburgo. Em 1582, Norberto foi canonizado pelo Papa Gregório XIII e, em 1626, seu corpo foi transportado para a abadia de Strahov, em Praga, na República Tcheca, onde está guardado até hoje” (p. 28). Cabe-nos destacar, aqui, dois pontos muito importantes na vida de São Norberto a serviço de Deus em sua Igreja: um em defesa da Eucaristia e outro do Papado.

1) “A grande campanha que Norberto guiou contra Tanquelmo, na cidade de Antuérpia, na Bélgica. Tanquelmo era uma figura carismática, mas herética, que teria negado a presença de Cristo na Eucaristia e, por meio de suas pregações inflamadas, conseguiu levar uma grande parte da população a seguir suas doutrinas que induziam o povo a práticas imorais. Norberto e seus discípulos venceram o herege e fizeram o povo voltar ao caminho de Deus. Para consolidar o seu apostolado em Antuérpia, foi fundada a célebre abadia de São Miguel, supressa pela Revolução Francesa em 1796” (São Norberto: o defensor da Eucaristia, p. 23). Daí escrever o Papa Francisco: “Seguindo os passos de São Norberto, a piedade dos Premonstratenses dedicou um lugar cada vez mais central à Eucaristia, quer na solene e recolhida celebração comunitária, quer na adoração silenciosa. Tal como Ele está presente para nós no Sacramento, assim o Senhor quer estar presente através de nós na vida das pessoas que encontramos. Que vós, irmãos e irmãs, possais tornar-vos o que celebrais, recebeis e adorais: o corpo de Cristo, e n’Ele um lar de comunhão, no qual muitos podem ser aquecidos” (Discurso aos Cônegos Regulares Premonstratenses, 22/09/2022).

2) Após a morte do Papa Honório II, em 1130, foi eleito o Papa Inocêncio II. Mas essa eleição foi contestada pelo Cardeal Pedro de Leoni, que se fez eleger também Papa por um outro grupo de cardeais, tomando o nome de Anacleto II. O imperador da Alemanha, Lotário, acompanhado do Arcebispo Norberto, seu chanceler, dirigiu-se, por isso, à Itália a fim de expulsar o usurpador do trono pontifício e de instalar o Papa Inocêncio II na Basílica de Latrão. No dia 30 de abril de 1133, Lotário foi coroado na Basílica de Latrão, uma vez que o antipapa ocupava sempre a Basílica de São Pedro. Depois da coroação, porém, o imperador pediu ao Papa o direito de nomear os bispos. É graças à enérgica intervenção de Norberto que o Papa lhe recusou” (p. 28). É o Papado fator de unidade na Igreja!

Pois bem, “em 1896, chegaram ao Brasil os primeiros premonstratenses, saídos das restauradas abadias de Averbode e de Park, ambas situadas na Bélgica, para iniciarem seus trabalhos nos Estados de São Paulo e de Minas Gerais. As casas de Jaú, de Pirapora do Bom Jesus, do Jardim Europa, na cidade de São Paulo, de Piracicaba e de Petrópolis (casa desativada em 1993), fundadas pelos religiosos da abadia de Averbode, Bélgica, evoluíram durante o século XX e formam hoje a Canonia Jauense, criada em 16 de janeiro de 1979, sendo um Priorado. Depois do Capítulo Geral da Ordem, em 2000, o Priorado foi elevado à condição de Abadia de São Norberto, em Jaú, SP, em 28 de julho de 2000, sendo o primeiro abade o Cônego Bonifácio, O. Praem. No Estado de Minas Gerais, foi fundada pelos religiosos da abadia de Park, Bélgica, uma casa em Montes Claros e em Contagem, formando, assim, a Canonia de Montes Claros com o Priorado de São Norberto e Nossa Senhora Aparecida, localizado na cidade de Montes Claros. Em 1994, os religiosos da abadia de Geras, Áustria, iniciaram seus trabalhos em Itinga, bairro de Lauro de Freitas, BA, onde fundaram o priorado de São Norberto. No início de 2009, foi criada a Canonia de Itinga” (p. 49-50).

Fiéis à vida canonical, os cônegos norbertinos formam comunidade, rezam a Liturgia das Horas em comum, são ardorosos devotos da Eucaristia, da Virgem Maria e trabalham, de modo pastoral, com o povo de Deus que a Igreja lhes confia. Daí, uma vez mais, escrever-lhes, com apreço, o Papa Francisco: “As comunidades da vossa Ordem aceitaram esta herança e, há nove séculos, levam a cabo a sua missão no espírito da Regra de Santo Agostinho, em fidelidade à meditação e à pregação do Evangelho, inspirando-se no Mistério eucarístico, manancial e ápice da vida da Igreja” (Carta ao Abade Geral dos Cônegos Regulares Premonstratenses por ocasião do 900 aniversário da Abadia de Premontré, 06/06/2021).

Só nos resta, junto aos melhores votos natalinos, dar, em forma de prece grata a Deus, os parabéns pelo aniversário de fundação da Ordem Premonstratense e desejar que – por intercessão da Virgem Maria, de São Norberto e demais santos e santas dessa grande família religiosa – Deus a cumule de copiosas bênçãos e graças. Amém.

Tags:
História da IgrejaIgrejaReligiosos
Top 10
Ver mais
Boletim
Receba Aleteia todo dia