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Padaria mantém vivas as centenárias e deliciosas receitas desenvolvidas por freiras de clausura

minne della Vergine, Sicilian sweets

mkos83 | Shutterstock

Minne della Vergine, um doce siciliano

V. M. Traverso - publicado em 27/03/23

O projeto “Segredos do Claustro” nasceu para preservar as maravilhosas receitas desenvolvidas por religiosas ao longo dos últimos 800 anos

De cannoli a biscoitos de amêndoa, passando por cassatelle recheado com ricota: devemos muito da maravilhosa culinária siciliana à criatividade de freiras de clausura.

A tradição tem raízes na Idade Média, quando as freiras costumavam fazer doces e biscoitos para presenteá-los a visitantes, como bispos, médicos e contadores. Na segunda metade do século 15, o açúcar tornou-se mais comum e essa tradição de confeitaria começou a se expandir. As freiras passaram a fazer todo tipo de doces para vender. 

Durante séculos, os sicilianos costumavam visitar mosteiros como o Mosteiro do Espírito Santo, fundado em 1299 em Agrigento, ou o mosteiro beneditino de Palma di Montechiaro, durante as festividades. Eles esperavam pacientemente a sua vez de comprar bandejas de cannoli, cassatelle ou nucatili (biscoitos recheados com nozes e canela) fresquinhos.

Nos últimos anos, muitos desses mosteiros fecharam. Estima-se que no século 18 existissem 21 conventos de confeitaria em Palermo, enquanto hoje restam apenas alguns. À medida que as freiras de clausura desapareciam progressivamente da vida siciliana, as receitas centenárias que elas haviam concebido estavam prestes a se perder. Mas o amor que os sicilianos têm por esses doces inventados por freiras e monjas está ajudando a preservar essa tradição de longa data. 

Cassatelle, semi-circular dough pockets filled with ricotta
Cassatelles: massas semicirculares recheadas com ricota que foram inventadas por religiosas sicilianas enclausuradas.

Preservação da história

Em Palermo, o Monastero Santa Caterina era fonte de doces feitos por suas religiosas há pelo menos 700 anos. Os moradores locais lembram-se vividamente do cheiro dos pastéis assando enquanto atravessavam a praça para assistir à missa ou visitar a igreja para se confessar. 

Mas, em 2014, a última religiosa enclausurada remanescente do local deixou Palermo. A grande estrutura centrada em torno de um belo claustro ladeado de árvores cítricas foi transformada em museu. Os moradores ficaram felizes por poder continuar visitando o mosteiro, ainda que como um museu, mas muitos sentiram saudade da época em que o cheiro de canela impregnava o ar na vizinhança.

The facade of the Church of Santa Caterina in Palermo.
Fachada da igreja de Santa Catarina, em Palermo.

Em 2019, um grupo de empresários locais reabriu a cozinha histórica que funcionava há séculos no local. A padaria, chamada “Os Segredos do Claustro”, fica aberta todos os dias e é considerada mais um laboratório do que uma confeitaria convencional. Ali, os chefs confeiteiros podem oferecer aulas abertas sobre a confecção de uma massa específica ou explicar como uma receita antiga foi concebida.

Tudo é produzido de acordo com a tradição, exceto pelo uso de um único rolo de massa mecânico que foi introduzido para agilizar as operações. 

Cannoli from Nuns
Cannolis feitos na hora na nova confeitaria.

Durante a semana a loja produz biscoitos, tortas e doces, incluindo as famosas cascas de frutas cítricas cristalizadas e os cannolis recheados na hora. No fim de semana, serve itens mais elaborados como a cassata (um pão de ló redondo recheado com licor, ricota e frutas cristalizadas) e o minne della Vergine, literalmente “seios da Virgem”, pastéis em forma de cúpula recheados com leite, abóbora cristalizada, chocolate e canela. 

“Muitos turistas vêm nos visitar seguindo os conselhos dos confeiteiros”, disse Maria Oliveri, uma das fundadoras dos “Segredos do Claustro”, em entrevista à revista gastronômica italiana Gambero Rosso. “Os chefs aconselham as pessoas a virem aqui para redescobrir as origens dos confeiteiros sicilianos.” 

Em 2019, Oliveri publicou um livro intitulado Os segredos do claustro, descrevendo todas as receitas feitas por religiosas que ela encontrou durante sua pesquisa sobre a cultura da confeitaria em mosteiros de clausura na Sicília. 

Uma das revelações encontradas no livro é que além de pastéis, biscoitos e bolos, as religiosas preparavam pratos como lasanha de berinjela, azeitonas recheadas e sfincione, uma espécie de focaccia coberta com molho de tomate.

Por trás de todo grande prato siciliano parece haver uma grande receita de que saiu dos mosteiros (e que precisa ser preservada). 

Tags:
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