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O importante é ser feliz! Será mesmo?

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Julia A. Borges - publicado em 17/09/23
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Antes de afirmar que o importante é ser feliz, há que se atentar ao conceito de felicidade que está sendo usado, porque tal equívoco pode ser até mesmo fatal

Antes de entender acerca da importância real da felicidade, é interessante analisar o significado legítimo de ser feliz, e para tanto, faz-se extremamente necessário abandonar certos padrões impostos pelo mundo e buscar definitivamente a experiência de pensar, experiência muito realizada por tantos em todos os dias, mas raramente convertida à luz natural da razão. Afinal, para além do pensar, é importante refletir a racionalidade que nos move, no sentido mais profundo da palavra.

O cérebro dos animais costuma acessar as coisas a partir das sensações, ou seja, quando um bicho tem uma sensação de prazer, ele avalia tal situação como tendo sido boa; se foi doloroso, tal cenário é colocado como ruim. O animal não consegue acessar a verdade, apenas a sensação, ou seja, é o prazer que o move, é a satisfação total e completa que torna algo bom ou algo ruim. Já o ser humano, com sua habilidade de pensar o racional e também de compreender a transcendência do ser, deveria ir muito além dessa esfera naturalista que a sociedade atual quer impor da simples dualidade entre sensação agradável e não agradável.

Tomemos como exemplo dessa dinâmica o uso da vacina: uma pessoa com a capacidade de raciocinar entende a natureza do corpo humano e a composição da injeção e percebe a verdade que para a doença essa injeção é boa, mesmo sendo dolorosa e  desagradável, mas sabe que é útil. Aqui foi possível quebrar uma barreira que o animal não poderia entender; o ser humano é capaz de enxergar uma verdade que o animal não enxerga porque o bicho só entende as sensações e para ele o verdadeiro é aquilo que é prazeroso, e o que é doloroso só pode ser falso. Mas para o ser humano virtuoso que busca a verdade é possível enxergar a verdade em uma injeção, mesmo que aquilo seja algo penoso.

Dado o exemplo, fica mais claro entender a dinâmica que o mundo está querendo limitar o ser humano, fica notório perceber que reduzir a capacidade de compreensão da verdade do individuo é meta para uma sociedade que constantemente busca o imediato e superficial mundo das puras satisfações. Portanto, antes de afirmar que o importante é ser feliz, há que se atentar ao conceito de felicidade que está sendo usado, porque tal equívoco pode ser até mesmo fatal. E para fazermos a experiência maravilhosa de pensar, é necessário que entendamos uma particularidade do conhecimento humano que nos faz superiores a todos os outros animais. Enquanto estes, usando simplesmente o seu cérebro, fazem julgamentos a partir de sensações, associando ao bem apenas ao que é prazeroso, o ser humano é capaz de ir além desse conhecimento sensível. Porque a busca virtuosa da verdade, mesmo que doa, vale e valerá sempre a pena ser buscada.

Apliquemos esse entendimento, concretamente, à questão da felicidade. Cristo não associou a experiência libertadora da Verdade (cf. Jo 8, 32) à sensação de prazer, senão à cruz e ao sofrimento. Com isso, Ele dava-nos a entender que o sentimento não serve para medir a verdade das coisas. Afastemos esse engano de nossas mentes, pois sob a ilusão desse sentimentalismo dos tempos atuais é que padecemos em busca de prazeres que nos colocam como verdadeiros deuses de nossas vidas e acabamos por nos perder ao tomarmos tantos caminhos alternativos.

Ser feliz não deve ser entendido como um ser hedonista, com a meta primeira e única pelo prazer, mas ir além do próprio umbigo; entretanto, há um caminho perigoso nessa estrada porque livrar-se por completo do mundo das sensações é aniquilar todo o aspecto humano ofertado por Deus. Temos a divina capacidade de amar e ao mesmo tempo somos possuidores de uma máquina extraordinária mas totalmente limitada que é o corpo humano. Somos uma complexa criação que não pode ser reduzida ao corpo nem entendida como somente alma. A felicidade está nessa linha, no entendimento, na racionalidade, na compreensão da Verdade que nos liberta do mundo mesmo ainda estando no mundo, que nos liberta do aprisionamento das sensações do corpo mesmo ainda estando nele. Ser feliz é ir além das sensações e quando se compreende a verdade das coisas, compreende-se também o bem delas e naturalmente a felicidade faz morada.