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O que o papa realmente disse sobre bênção a uniões homossexuais?

Papa Francisco
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Francisco Vêneto - publicado em 06/10/23
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Parte da imprensa deu a entender que Francisco teria mudado a doutrina católica sobre o casamento

Como costuma acontecer toda vez que o papa diz qualquer coisa relacionada com qualquer assunto considerado polêmico, uma parte da imprensa deu a entender, nesta semana, que Francisco teria mudado a doutrina católica no tocante ao casamento, autorizando que fossem abençoadas pela Igreja as uniões entre pessoas homossexuais. E como acontece toda vez que uma parte da imprensa dá a entender que Francisco mudou a doutrina católica no tocante ao que quer que seja, a própria Igreja precisa desmentir essa parte da imprensa e esclarecer que não foi isso o que de fato aconteceu.

Esse tipo de episódio tem sido relativamente frequente com o Papa Francisco, famoso pela espontaneidade em responder a tudo o que lhe perguntam. Aliás, uma parte da imprensa também era ávida em divulgar mentiras supostamente ditas pelo Papa Bento XVI, o que leva a observar que, seja quem for o papa e seja o que for que ele diga, essa mesma parte da imprensa fará o papel oposto ao que se espera dela e deturpará a verdade, imune à seletividade do policiamento ideológico.

Mas o que foi que o papa disse sober o casamento entre pessoas homossexuais?

Segundo uma parte da imprensa, Francisco teria aberto este caminho dando agora o primeiro passo: a suposta autorização de bênçãos para casais do mesmo sexo.

Esta interpretação não se fundamenta. Segundo o próprio papa, o casamento perante a Igreja é somente entre um homem e uma mulher. Portanto, a Igreja se opõe a quaisquer práticas, inclusive bênçãos, que possam causar confusão a este respeito.

E de onde veio o disse-que-disse sobre o que o papa (não) disse?

Veio do fato de que um grupo de cardeais apresentou ao Papa Francisco uma série de perguntas, que em latim são chamadas de "dubia", entre as quais a indagação de se a prática hoje crescente de abençoar uniões homossexuais está ou não está de acordo com a doutrina da Igreja Católica. O papa respondeu que não está, pela razão exposta acima. No entanto, pediu que esta verdade sobre a natureza do casamento seja exposta sem ferir a caridade:

"A defesa da verdade objetiva não é a única expressão dessa caridade, que também é composta de bondade, paciência, compreensão, carinho e encorajamento. Logo, não podemos tornar-nos juízes que apenas negam, rejeitam e excluem".

Nesta linha, pediu também prudência pastoral para se analisar "se existem formas de bênçãos, solicitadas por uma ou mais pessoas, que não transmitem um conceito errado de casamento".

Desenhando: o papa disse que um casamento que não esteja de acordo com a doutrina católica não pode ser abençoado pela Igreja Católica, mas que as pessoas que pedem uma bênção podem receber uma bênção - desde que essa bênção seja dada a elas próprias, como pessoas, e não à sua eventual forma de casamento que não atenda aos requisitos da Igreja para ser considerada um matrimônio católico.

Em suma, Francisco não disse nada que já não tenha sido dito por ele próprio e por todos os papas que o precederam, bem como por todos os que o sucederão.

Bênção a pessoas ou bênção à sua união?

Segundo o papa, "quando uma bênção é solicitada, isso expressa um pedido de auxílio de Deus, um desejo de poder viver melhor, confiança num Pai que nos pode ajudar a viver melhor".

Francisco observa que é possível abençoar duas pessoas que estão numa relação, sem que isto signifique abençoar a relação como tal.

De fato, bênçãos podem ser dadas a casas, carros, hospitais, empresas, animais, pessoas. Não há razão para se confundir uma bênção pontual a uma pessoa com uma chancela sacramental a todo o seu estado ou estilo de vida.

A resposta do papa na íntegra

Conforme publicada no portal de notícias oficial do Vaticano, reproduzimos a resposta do Papa Francisco ao "dubium" dos cardeais "sobre a afirmação de que a prática difusa de abençoar uniões do mesmo sexo está de acordo com a Revelação e o Magistério (CCC 2357)":

a) A Igreja tem uma concepção muito clara do matrimônio: uma união exclusiva, estável e indissolúvel entre um homem e uma mulher, naturalmente aberta a gerar filhos. Somente essa união pode ser chamada de "matrimônio". Outras formas de união o realizam apenas "de maneira parcial e analógica" (Amoris laetitia 292), portanto não podem ser chamadas estritamente de "matrimônio".

b) Não se trata apenas de uma questão de nomes, mas a realidade que chamamos de matrimônio tem uma constituição essencial única que requer um nome exclusivo, não aplicável a outras realidades. É, sem dúvida, muito mais do que um mero "ideal".

c) Por essa razão, a Igreja evita qualquer tipo de rito ou sacramental que possa contradizer essa convicção e levar a entender que se reconheça como matrimônio algo que não o é.

d) Todavia, em nosso relacionamento com as pessoas, não devemos perder a caridade pastoral, que deve permear todas as nossas decisões e atitudes. A defesa da verdade objetiva não é a única expressão dessa caridade, que também é composta de gentileza, paciência, compreensão, ternura e encorajamento. Portanto, não podemos ser juízes que apenas negam, rejeitam, excluem.

e) Portanto, a prudência pastoral deve discernir adequadamente se existem formas de bênção, solicitadas por uma ou mais pessoas, que não transmitam um conceito errôneo de matrimônio. Pois, quando se pede uma bênção, está se expressando um pedido de ajuda a Deus, uma súplica para poder viver melhor, uma confiança em um Pai que pode nos ajudar a viver melhor.

f) Por outro lado, embora existam situações que, de um ponto de vista objetivo, não são moralmente aceitáveis, a mesma caridade pastoral exige que não tratemos simplesmente como "pecadores" outras pessoas cuja culpa ou responsabilidade pode ser atenuada por vários fatores que influenciam a imputabilidade subjetiva (cf. São João Paulo II, Reconciliatio et Paenitentia, 17).

g) As decisões que podem fazer parte da prudência pastoral em determinadas circunstâncias não precisam necessariamente se tornar uma norma. Ou seja, não é conveniente que uma Diocese, uma Conferência Episcopal ou qualquer outra estrutura eclesial habilite constante e oficialmente procedimentos ou ritos para todo tipo de questão, pois tudo "que faz parte de um discernimento prático diante de uma situação particular não pode ser elevado ao nível de norma", porque isso "daria lugar a uma casuística insuportável" (Amoris laetitia 304). O Direito Canônico não deve e não pode abranger tudo, nem as Conferências Episcopais, com seus vários documentos e protocolos, devem pretender isso, uma vez que a vida da Igreja flui por muitos canais além dos normativos.

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