Queremos sempre atender da melhor forma todos os desejos de nossos filhos. Mas satisfazer cada um de seus desejos não os ajuda a crescer e se preparar para enfrentar a vida em sociedade
Alguns pais acabam abandonando toda a noção de limites e restrições na educação dos filhos. Como resultado, seus filhos passam a não saber conviver coletivamente, não sabem atender as necessidades da vida em comunidade. Didier Pleux, psicoterapeuta, nos diz qual é a chave fundamental para fazer uma criança crescer e florescer, de forma sociável e forte: “a frustração”.
Você não tem medo de ser chamado de tirano quando fala sobre frustração?
Não, não tem nada a ver com tirania! Não estou falando sobre uma frustração afetiva, mas uma frustração em relação ao prazer exacerbado. Pais que são muito permissivos podem não entender isso. Frustração significa falta, desprazer, espera. Uma criança que foi inteligentemente frustrada não vai achar ruim ir para a cama no horário certo, cumprimentar as pessoas, comer novos alimentos, brincar com outras crianças, etc.
Esta é uma boa solução para aliviar o desejo de onipotência de muitas crianças. Mas o amor e a frustração são inseparáveis, um sem o outro seria de fato um retorno ao autoritarismo. Não nego as conquistas positivas da psicologia valorizando o diálogo com a criança, mas não podemos deixar de ensinar também sobre o mundo real porque esse aprendizado não é inato. Muitas famílias esqueceram qualquer noção de desprazer, exigências e correção, privilegiando apenas a comunicação, a valorização da criança e sua proteção. É por isso que tantas crianças desenvolvem uma hipertrofia do ego e uma grande intolerância a ser contrariada.
Por que aprender com a frustração é tão importante na educação dos filhos?
Os humanos naturalmente são inclinados ao princípio do prazer, ao gozo, ao imediatismo, tudo que seja bem distante da realidade de restrições e proibições. A frustração é essencial para que a criança se torne independente. Hoje em dia, as crianças estão tão “mandonas” que usurparam a autoridade dos adultos, suprimindo toda hierarquia. São eles que decidem tudo, como os programas de TV e horários das refeições. A frustração traz a autoridade de volta ao lar.
Porém, cuidado com o excesso em uma direção ou outra: frustrar demais é destruir o desejo da criança; não frustrar em absoluto é deixá-la em um desejo onipotente. Hábitos (como ajudar nas tarefas da casa) devem ser incentivados, para que a criança não viva apenas como deseja. Diga não a certas satisfações imediatas (TV, videogame, etc.) para dar-lhe uma sensação de esforço e perseverança.
Por que é tão difícil para os pais verem seus filhos frustrados?
Sempre lhes disseram que uma criança frustrada é uma criança infeliz. Ao passo que são exatamente as crianças que viveram frustrações ao seu querer que serão capazes de se recompor das provações pelas quais passarem na vida. Muitos pequeninos não sabem mais se concentrar, criar ou sonhar. Eles apenas consomem, e desistem de qualquer iniciativa no momento que elas se tornam um pouco difíceis.
Nossas famílias estão imersas na televisão, na Internet, nos videogames e em todos os tipos de vícios. O hábito de consumir enfraqueceu nossa tolerância à frustração. A vida tem realidades difíceis de suportar (desemprego, divórcios, etc.), mas apesar de tudo queremos uma primeira infância banhada em um relacionamento de amor e alegria. Por isso, é preciso buscar o bom senso na educação dos filhos.
Um esforço dos pais sobre eles próprios?
Sim, claro! É uma luta pessoal porque você não gosta de ver seu filho frustrado. Mas as pessoas confundem uma criança infeliz com uma criança frustrada. Muitos pais foram enfraquecidos em sua autoridade por causa de leituras que lhes disseram que tudo está no relacionamento. Outros se recusam a ser exigentes porque sua vida é difícil e eles querem evitar entrar em conflito com seus filhos. Se somos exigentes com a higiene de uma criança, podemos ser exigentes também em outras áreas como as brincadeiras, a alimentação ou o ritmo de vida. A exigência não significa que vamos retirar a sua liberdade de ser.
O que você diria aos pais que estão sem esperanças?
Nos sentimos desanimados porque a criança é resistente à frustração. Claro que seu filho nunca dirá: “Obrigado mamãe e papai, vocês estão me frustrando, isso é muito bom porque me fortalece!”. Ao invés disso, a criança dirá: “Eu quero outra história, só mais um desenho animado, brincar só mais um pouquinho, só mais…”.
A realidade é frustrante! Desde os primeiros dias no berçário ou no parquinho, a criança se depara com a vida: o mais velho pega o brinquedo do mais novo, uma criança talentosa para o trabalho manual receberá mais elogios do que ela. Um dos segredos para preparar os jovens para a vida e dar-lhes autoconfiança é torná-los conscientes de suas fraquezas e qualidades.
Como crescem as crianças que não toleram a frustração?
Essa intolerância pode crescer e se tornar exponencial. Os jovens se tornam então cada vez mais frágeis. Não compartilho da opinião dos psicólogos sobre a famosa crise da adolescência. O que existe na verdade é uma nova fase, ligada à puberdade e aos primeiros sofrimentos a serem enfrentados.
As crianças que se sentem reis ou rainhas tendem então a ficar deprimidas. Quando chegam em terceiro ou segundo lugar, a escola não dará tantos prêmios e vamos nos tornando menos bons, porque precisamos trabalhar mais, colocar mais dedicação e esforço. A criança que permaneceu centrada em si mesma, adorada pelos pais, não entende porque a professora não a considera tão grande e perfeita como sua família. Já uma outra criança muito esforçada ao piano, em vez de trocar de instrumento a cada seis meses, será recompensada aos 16 anos por ter aprendido mais rápido do que se espera. Não devemos ficar nos perguntando por que alguns adolescentes se refugiam em um mundo virtual. Os videogames e os vícios como as drogas nada mais são do que fugas de um mundo difícil de lidar!
Como evitar traumatizar a criança se a frustração for mal medida?
A criança deve ser respeitada como sendo uma pessoa completa. Ela não será capaz de entender restrições se elas não forem ensinadas em um ambiente amoroso, estimulante e respeitoso. As restrições devem ser inseridas nas pequenas coisas da vida cotidiana como colocar o prato na pia após a refeição, não deixar seus brinquedos espalhados por toda a casa, etc. A chave é nunca renunciar à sua autoridade como pai e mãe.
O que é autoridade justa? Como não cair no autoritarismo, na permissividade ou nas palavras sem força?
Acima de tudo, não devemos agir sob a influência das emoções. Nessas situações a raiva é desproporcional e as punições serão estéreis e inadequadas. Alguns pais se lembram da infância e temem reproduzir um padrão que viveram: “Meu pai era autoritário, por isso eu nunca vou levantar a voz!”. Devemos manter o controle, mas sendo firmes desde o início.
Esta é a minha teoria sobre a autoridade: Eu antecipo e impeço que a criança cruze os limites. Antecipo seus excessos impondo pequenas frustrações: de manhã, ele leva o prato para a pia, amarra os sapatos sozinho, e assim por diante. Podemos pedir esse tipo de coisas a uma criança sem precisar cair na necessidade de explicação constante. A criança ainda não tem autonomia para dizer: “Eu sei quando tenho que ir para a cama, fazer o dever de casa, etc”. Isso é romantismo!
Maylis Guillier