O que poderia ser mais familiar e, à primeira vista, mais doce do que um presépio de Natal? No entanto, nós não somos capazes de entender seu significado simbólico completoComo entrar no mistério do Natal? E como cultivar as graças da Natividade ao longo do ano? A seguir encontre uma entrevista com o Irmão Éric Bidot, capuchinho, guardião do convento francês de Clermont-Ferrand.
Por que, em 1223, São Francisco criou um presépio vivo?
Francisco viveu com Cristo. Ele o viu nos acontecimentos e nos encontros da vida quotidiana, reconheceu-o nos irmãos, especialmente nos mais pobres. Francisco tinha apenas um desejo: encontrar, ver, tocar seu Senhor. No Evangelho, dois mistérios da vida de Cristo trouxeram lágrimas aos seus olhos: a crucificação e a natividade. Francisco se apresenta como um homem “simples”, é artista, poeta, sensível. Para entender o evangelho, ele precisava vê-lo, tocá-lo, experimentá-lo.
Como as pessoas reagiram?
Mesmo se não temos nenhum vestígio do que Francisco disse durante seu sermão, diz a lenda popular que as pessoas ficaram tão tocadas que saíram com os fios de palha, a ponto de não sobrar nem um só. Além disso, sua maneira de falar sobre Jesus despertou fé e fervor. Tendo a pensar que Francisco pregava sobre a humildade de Deus: como o Deus três vezes santo, criador do universo, senhor do tempo e da história, pôde fazer-se homem, e nascer tão pobre? O presépio revoluciona a imagem que poderíamos ter de Deus: um Deus que se humilha para a nossa salvação.
Como entrar na contemplação deste mistério?
Concordemos em deixar-nos levar e ser tomados pelo mistério que se vive diante de nossos olhos. Coloquemo-nos na escola da humildade de Deus. Para aplaudir o maior milagre da história, precisamos encontrar nossa criança interior. Devíamos ficar chateados com o presépio, pois nossos berços nunca serão bonitos o suficiente. Devemos tentar torná-los ícones reais e contemplá-los com admiração por tão grande mistério!
É importante que, no presépio, sejam representadas as atividades ordinárias e concretas das pessoas de ontem e de hoje, imersas na vida cotidiana. Por que não adicionar médicos, operários da construção, fazendeiros, comerciantes, aos personagens tradicionais? No presépio, toda a criação é convocada: o cosmos, os elementos naturais, o pequeno e o grande deste mundo. Deus se faz homem para renovar e reconciliar toda a criação por dentro.
É este o cerne da mensagem do presépio?
O presépio é um mistério de simplicidade. Percebamos verdadeiramente que os pastores – as primeiras testemunhas do nascimento do Salvador – estavam entre os mais pobres e os mais desprezados dos judeus de seu tempo. Se tivéssemos coração e mãos de pobres, facilmente entraríamos no júbilo da contemplação deste grande mistério.
No Natal, a presença do Emanuel (“Deus conosco”) revela-nos a simplicidade do Amor. Deus é simples. Somos nós que nos complicamos com o nosso pecado. Na manjedoura, Deus está lá. Mistério que ecoa a exclamação de Santo Agostinho: “Tarde demais eu Te amei! Eis que estavas dentro, e eu, fora – e fora Te buscava, e me lançava, disforme e nada belo, perante a beleza de tudo e de todos que criaste. Estavas comigo, e eu não estava contigo… seguravam-me longe de ti as coisas que não existiriam senão em ti. ”
Como você cultiva a graça do Natal ao longo do ano?
Permitindo que Deus transforme todos os nossos relacionamentos: nosso relacionamento com ele, com nós mesmos e com os outros. Esta não é uma técnica psicológica, mas uma verdadeira conversão espiritual. E para isso só existe um caminho: a oração pessoal. Sem ela é impossível viver da graça do Natal. É um pedido exigente, mas é a verdade. Todos os dias, Deus só pede para renascer em nós, para nos dar a paz e a alegria do Natal. Não uma fachada de paz e alegria entusiasmada, mas uma paz profunda e a alegria de saber que se é amado. Não temos pelo menos cinco minutos por dia para que Deus se encarne em nós?
Correndo o risco de soar provocativo, uma pergunta: por que Deus se encarnou?
Para nos dizer que todo homem é filho e filha de Deus! Para nos revelar a verdadeira face de Deus e, ao mesmo tempo, restaurar nosso relacionamento com o Pai no céu. “Deus se fez homem para que o homem se tornasse Deus”, dizia Santo Irineu no século II. Jesus, sendo verdadeiro Deus e verdadeiro homem, reconcilia o homem na sua pessoa com Deus e conduz o homem à sua dimensão verdadeira e plena. Encarnando-se, o Verbo Eterno revela a onipotência da sua bondade, da sua misericórdia e da sua ternura. Em Jesus, ele se faz muito próximo, muito pequeno para não nos assustar. A manjedoura, como a Eucaristia, é a revelação de um Deus que se faz servo de cada homem para nos anunciar toda a sua força de amor. Como diz uma das canções de natal mais antigas: “Da manjedoura à crucificação, Deus nos revela um grande mistério”.
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Entrevista por Emmanuel Pellat