Vinho novo do Espírito
Temos duas maneiras de conhecer os objetos: o conhecimento que podemos adquirir por meio do que ouvimos e o conhecimento que podemos adquirir por nós mesmos. Com a primeira, não alcançamos o objeto em si, mas o percebemos por meio das palavras, como em imagem [...]; pelo contrário, experimentar objetos é encontrar-se com eles mesmos. Na segunda forma de saber, o objeto se prende na alma e desperta o desejo como um rastro à medida de sua beleza. Da mesma forma, quando nosso amor pelo Salvador não produz em nós nada de novo ou extraordinário, é evidente que nada há em nós que se relacione com as palavras que ouvimos sobre ele. Como poderíamos conhecer por ouvir dizer e tal como o merece, aquele a quem nada se assemelha a ele, aquele a quem nada pode ser comparado e que não pode ser comparado a nada? Como poderíamos conhecer sua beleza e amá-la de acordo com a medida dela? Mas quando os homens experimentam um vivo desejo de amá-lo, um vivo desejo de fazer por ele coisas que estão além da natureza humana, é evidente que foi o próprio Esposo que os feriu. Abriu-lhes os olhos para sua beleza. A profundidade da ferida atesta que a flecha atingiu o ponto certo; o ardor de seu desejo revela quem os feriu. Com isso, fica claro que a nova Aliança é diferente da Antiga: antes os homens eram educados por uma palavra; hoje é Cristo pessoalmente presente que, de modo indizível, prepara e molda as almas dos homens. Se o ensino da Lei tivesse sido suficiente para levar o homem ao seu fim, os atos extraordinários de um Deus feito homem, crucificado e que morre, não teriam sido necessários. Isso também se aplica aos apóstolos, nossos pais na fé. Eles haviam ouvido os ensinamentos do Salvador, as palavras saídas de sua boca; eles viram seus milagres e tudo o que ele teve que sofrer pelos homens, eles o viram morrer, ressuscitar e retornar ao céu. Eles sabiam de tudo isso, mas nada de novo, nenhuma generosidade, nada verdadeiramente espiritual foi percebido neles, até que foram batizados no Espírito Santo. Só então o verdadeiro desejo por Cristo se acendeu neles e por eles, nos outros.
Nicolau Cabásilas
Vida em Cristo: Deus deve nos tocar no ponto certo, «O vinho novo do Espírito» (cf. Mc 2,22) II, 75s
Teólogo ortodoxo bizantino do século XIV (†1390)