“Se não tiver amor, nada serei”: mas de que grau de amor estamos falando? No capítulo 13 da primeira epístola aos coríntios, provavelmente uma das passagens mais belas e célebres da Bíblia e da literatura universal, São Paulo fala do amor. “Se não tiver amor, nada serei“…
Algumas traduções adotam a palavra “caridade”, em vez de “amor”, e já veremos por quê.
O termo original, em grego antigo, é “agape” – um dos diversos vocábulos que esse riquíssimo idioma possui para se referir ao amor.
Basicamente, os antigos gregos distinguiam três graus de amor:
– Eros (pronuncia-se “éros“): o amor sensorial, de emoção, de sensações, carnal, sensual, que busca na outra pessoa uma satisfação pessoal. Dessa palavra vêm os nossos termos “erotismo”, “erótico”.
– Philia (pronuncia-se “filía“): o amor de amizade, de reciprocidade, que busca ser correspondido, mas que também oferece, doa, entrega. Dessa raiz grega procedem termos como “filosofia” (amor de amizade com a sabedoria), “filantropia” (amor de reciprocidade com a humanidade) etc.
– Agape (pronuncia-se “agápe” em grego antigo, mas deu origem ao termo “ágape” no português atual): é o amor que não busca nada para si mesmo; que se entrega inteiramente à pessoa amada com plena gratuidade, sem esperar nada em troca; o amor incondicional.
O significado do ágape sempre envolve o sacrifício pessoal do pensamento e da vontade em benefício da pessoa amada. Quem ama com amor de ágape é capaz de renunciar a si mesmo em prol da pessoa a quem ama. É o amor sem reservas, praticado por uma pessoa cuja realização está na realização do amado, mais que na própria.
A palavra “agape” foi usada de maneiras diferentes por uma vasta gama de autores, antigos e contemporâneos.
Para alguns autores, “agape” representa exclusivamente o amor divino, o único realmente capaz de tamanha entrega incondicional. Mas outros autores também entendem que o ser humano pode atingir esse grau de amor, ainda que em medida obviamente inferior à divina em função da imperfeição humana. Seria o caso, por exemplo, do amor em família, em que a mãe ou o pai são capazes de se esquecer de si mesmos pelos filhos, ou os irmãos que podem se amar a ponto de sacrificar-se um pelo outro sem pedir compensação. Também seria o caso do amor de verdadeira caridade, em que se ama o próximo com obras concretas de serviço a ele e sem nenhuma segunda intenção, nem sequer de vaidade ou de “autocontemplação” pelo dever cumprido.
De todo modo, o amor de ágape se distingue dos demais tipos de amor pela sua totalidade, radicalidade, generosidade, abnegação, entrega, plenitude. É a esse amor que São Paulo se refere quando afirma que, sem amor, nada será.
Primeira Carta aos Coríntios, capítulo 13:
1. Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, se não tiver amor de caridade, sou como o bronze que soa, ou como o címbalo que retine.
2. Mesmo que eu tivesse o dom da profecia, e conhecesse todos os mistérios e toda a ciência; mesmo que tivesse toda a fé, a ponto de transportar montanhas, se não tiver amor de caridade, não sou nada.
3. Ainda que distribuísse todos os meus bens em sustento dos pobres, e ainda que entregasse o meu corpo para ser queimado, se não tiver amor de caridade, de nada valeria!
4. O amor de caridade é paciente, o amor de caridade é bondoso. Não tem inveja. O amor de caridade não é orgulhoso. Não é arrogante.
5. Nem escandaloso. Não busca os seus próprios interesses, não se irrita, não guarda rancor.
6. Não se alegra com a injustiça, mas se rejubila com a verdade.
7. Tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta.
8. O amor de caridade jamais acabará. As profecias desaparecerão, o dom das línguas cessará, o dom da ciência findará.
9. A nossa ciência é parcial, a nossa profecia é imperfeita.
10. Quando chegar o que é perfeito, o imperfeito desaparecerá.
11. Quando eu era criança, falava como criança, pensava como criança, raciocinava como criança. Desde que me tornei homem, eliminei as coisas de criança.
12. Hoje vemos como por um espelho, confusamente; mas então veremos face a face. Hoje conheço em parte; mas então conhecerei totalmente, como eu sou conhecido.
13. Por ora subsistem a fé, a esperança e o amor de caridade – os três. Porém, o maior deles é o amor de caridade.