A questão trazida pelo recente suicídio de três padres no BrasilRecentemente, pessoas se assustaram – não sem razão – com a notícia do suicídio de três padres com idades entre 31 a 37 anos, em diferentes regiões do Brasil. Suspeita-se que foram vítimas da chamada Síndrome de Burnout.
Daí a questão: mas que é isso? – O termo burnout, do inglês “combustão completa”, passou a ser utilizado para definir um tipo de estresse relacionado ao trabalho. Esta palavra foi cunhada, na década de 1970, pelo psicólogo Herbert Freudenberger, para definir o esgotamento que acometia um grupo especifico de profissionais especialmente dedicados ao cuidado de outras pessoas, como, por exemplo, médicos, enfermeiros, sacerdotes etc.
Esses homens e mulheres, que se sacrificam pelos outros, são colocados sob extrema pressão e passam a se sentir esgotados, exaustos, apáticos e incapazes de lidar com a situação, ou seja, veem-se “completamente queimados”, tal qual um palito de fósforo que se consumiu completamente (“burnout”).
Isso posto, pode-se dizer que são fatores de risco para a manifestação da Síndrome de Burnout, a carga de trabalho pesada, o desequilíbrio na relação esforço-recompensa, a falta de auxílio no trabalho (escassez de profissionais), poucos recursos para executar a tarefa pedida, inconstância nos horários de trabalho, bem como trabalhar no cuidado de pessoas no final da vida ou ter visão idealista – e não real – do mundo.
Mais: segundo publicação da US National Library of Medicine, existem três principais grupos de sintomas que definem a Síndrome de Burnout. Vejamos, em linhas gerais, cada um deles.
O esgotamento emocional: as pessoas se sentem esgotadas, exaustas, sobrecarregadas, cansadas e sem energia suficiente para executar as atividades diárias. Fisicamente, o indivíduo apresenta também dores de estômago e problemas de digestão.
A alienação (relacionada ao trabalho): as pessoas acham seus afazeres cada vez mais negativos e frustrantes. Eles podem desenvolver uma atitude cínica em relação ao ambiente de trabalho e aos colegas. Também, ao mesmo tempo, cada vez mais se distanciam emocionalmente ou até se desprendem de seu ambiente laboral.
Apresentam ainda desempenho reduzido: burnout afeta principalmente as tarefas diárias, sejam elas executadas no trabalho, em casa ou no cuidado de membros da família. Pessoas com a síndrome são muito negativas no que diz respeito às suas atividades, têm dificuldade de concentração, são apáticas e dão mostras de falta de criatividade.
As consequências da Síndrome de Burnout são catastróficas, caso o indivíduo acometido não procure ajuda profissional ou se não ocorrer mudanças no seu ambiente de trabalho, podendo apresentar transtorno de estresse pós-traumático, abuso de álcool e/ou medicações e concepções suicidas.
Feita essa colocação da Síndrome de Burnout em si, passemos às questões morais e práticas. Começando pelo plano moral, é preciso deixar claro que do ponto de vista objetivo (do ato em si) o suicídio é sempre um pecado grave. No entanto, do ponto de vista subjetivo (da pessoa que cometeu tal desatino), há atenuantes psíquicas fortíssimas, de modo que só nos cabe entregar o suicida à misericórdia de Deus.
Não são só os sacerdotes que podem chegar a esse fim trágico, mas também, como foi dito, outros profissionais dedicados ao próximo. O sacerdote não deixa de ser humano. A graça divina no padre não violenta ou muda a sua natureza humana, de modo que dar serviços em demasia a ele e encorajá-lo com a fala batida, porém não totalmente verdadeira, segundo a qual “Deus dá força” é violar os limites do próximo.
Cabe, pois, após esta brevíssima exposição, pedir aos responsáveis religiosos e civis que repensem bem como tratam aqueles que Deus lhes confiou, especialmente nas horas que reclamam de um cansaço incomum, pois o caso, como se vê, é seriíssimo!
Vanderlei de Lima é eremita na Diocese de Amparo; Igor Precinoti é médico, pós-graduado em Medicina Intensiva (UTI), especialista em Infectologia e doutorando em Clínica Médica pela USP.