Em recente entrevista para um canal do YouTube, Raymond Kurzweil causou espanto mundial ao declarar que os seres humanos atingirão a imortalidade até 2030. O que facilmente passaria por mais um disparate dos que se ouvem ou leem todos os dias mereceu tamanha repercussão devido ao histórico de quem fez a declaração: o ex-engenheiro do Google é reconhecido por acertar previsões complexas sobre a evolução da tecnologia desde a década de 1990.
Acertos anteriores
Duas das mais célebres previsões de Kurzweil foram a de que o melhor jogador de xadrez do mundo perderia para um computador até o ano 2000 e a de que, até 2023, existiriam laptops de menos de mil dólares com capacidade de armazenamento superior à do cérebro humano. A primeira previsão se concretizou ainda em 1997, quando o famoso computador Deep Blue derrotou o célebre enxadrista azeri Gary Kasparov, até hoje considerado um dos maiores de todos os tempos. A segunda previsão também já pôde ser confirmada antes do prazo.
De fato, das 147 previsões divulgadas por Kurzweil ao longo de mais de 30 anos, cerca de 86% se confirmaram.
Bases da nova previsão
Para embasar a sua mais recente ousadia sobre a superação da morte biológica, Ray Kurzweil menciona a expansão de pesquisas em robótica, genética e nanotecnologia, que, a seu ver, ajudarão a evitar ou pelo menos a tratar com alto grau de eficácia as doenças ligadas ao envelhecimento. Ele considera que robôs microscópicos conseguirão reparar células e tecidos humanos a ponto de torná-los imunes a doenças letais como o câncer.
O ex-engenheiro do Google foi contratado pela gigante das buscas em 2012 para trabalhar em projetos de pesquisa que envolviam precisamente o aprendizado de máquinas (machine learning). Com base no vasto conhecimento que tem da área, ele afirma também que a conexão de robôs ao neocórtex cerebral levaria as pessoas a aprimorarem a inteligência e a melhorarem habilidades individuais como, por exemplo, a música.
Reações e controvérsias
As novas declarações de Ray Kurzweil geraram uma variedade de reações que oscilam do otimismo ao ceticismo quanto à probabilidade de que, dentro de apenas 8 anos, todas as doenças graves estejam em franco processo de erradicação. Afinal, essa erradicação, ainda que obviamente não venha a ser generalizada desde o começo para todos os seres humanos, teria que estar entre as premissas necessárias para que se pudesse afirmar que pelo menos um ser humano em 2030 tenha a sua "imortalidade" garantida.
Num cenário em que todo o planeta se viu assolado pela pandemia de covid-19 e ainda sofre as suas consequências, a perspectiva anunciada por Kurzweil parece compreensivelmente surreal para muita gente, tanto leiga quanto especialista. Além disso, a sua visão altamente otimista da "síntese homem-máquina" contrasta com graves alertas lançados por outros cientistas e estudiosos, também recentemente, sobre os riscos de que as máquinas inteligentes venham a "dominar a humanidade".
Nas últimas duas semanas, por exemplo, estiveram nas manchetes mundiais as declarações de nomes de peso como Elon Musk e Yuval Noah Harari sobre a necessidade emergencial de se regularem os avanços da inteligência artificial, que, segundo eles, estaria "saindo de controle". Alarmes semelhantes já tinham sido disparados ao longo de meses anteriores por outros nomes de destaque no próprio desenvolvimento da inteligência artificial, como o também ex-engenheiro do Google Mo Gawdat:
Elon Musk, aliás, está na chamativa situação de, por um lado, alertar contra o descontrole da inteligência artificial e, por outro, impulsionar ele próprio os implantes de dispositivos eletrônicos no corpo humano - nomeadamente o chip cerebral da sua empresa Neuralink. O bilionário enfrenta questionamentos, inclusive de agências reguladoras norte-americanas, sobre a segurança dessa tecnologia, cujos testes em seres humanos ele mesmo tinha anunciado que começariam no prazo de 6 meses a partir de novembro de 2022 - ou seja, até o presente mês de abril. Confira: