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Papa: é ilusão pensar que basta proteger apenas a si mesmo

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Photo by AFP/Louisa Gouliamaki/Pool / ANADOLU AGENCY

Reportagem local - publicado em 05/12/21

"Peço a Deus que nos acorde da indiferença por quem sofre, nos sacuda do individualismo que exclui, desperte os corações surdos às necessidades dos outros"

O Papa Francisco afirmou hoje que a migração “é um problema mundial, uma crise humanitária que diz respeito a todos”.

Ao visitar um centro de refugiados em Lesbos (Grécia), o Papa alertou que o futuro “só poderá ser sereno se for integrador”.

Pois quando são repelidos os pobres, repele-se a paz. Fechamentos e nacionalismos – a história no-lo ensina – levam a consequências desastrosas. Com efeito, como recordou o Concílio Vaticano II, são «absolutamente necessárias para a edificação da paz (…) a vontade firme de respeitar a dignidade dos outros homens e povos e a prática assídua da fraternidade» (Gaudium et spes, 78).

Ilusão tentar proteger apenas a si

O Papa alertou que e uma ilusão “pensar que seja suficiente salvaguardar-se a si mesmo, defendendo-se dos mais frágeis que batem à porta”.

O futuro colocar-nos-á ainda mais em contato uns com os outros. Para bem encaminhá-lo, não servem ações unilaterais, mas políticas de longo alcance. A história – repito – no-lo ensina, mas ainda não aprendemos. Não se volte as costas à realidade, acabe o contínuo descarregar de responsabilidades para os outros, nem se delegue sempre para outros a questão migratória, como se a ninguém importasse e fosse apenas um peso inútil que alguém é obrigado a carregar.

Acordar da indiferença

Em seguida, o Papa fez um pedido a Deus: “que nos acorde da indiferença por quem sofre, nos sacuda do individualismo que exclui, desperte os corações surdos às necessidades dos outros”.

E peço também ao homem, a todo o homem: superemos a paralisia do medo, a indiferença que mata, o desinteresse cínico que, com luvas de veludo, condena à morte quem está colocado à margem. Contrariemos na sua raiz o pensamento dominante, aquele que gira em torno do próprio eu, dos próprios egoísmos pessoais e nacionais que se tornam medida e critério de tudo.

O Papa recordou que se passaram cinco anos desde sua primeira visita aos refugiados e migrantes em Lebos.

Não é erguendo barreiras que se resolvem os problemas e melhora a convivência. Antes pelo contrário, é unindo as forças para cuidar dos outros segundo as possibilidades reais de cada um e no respeito da legalidade, colocando sempre em primeiro lugar o valor incancelável da vida de cada homem, de cada mulher, de toda a pessoa.

Partir da realidade

Segundo o Papa Francisco, em várias sociedades, há quem esteja, de forma ideológica, a contrapor segurança e solidariedade, local e universal, tradição e abertura.

Mais do que tomar partido pelas ideias, ajuda partir da realidade: parar, estender o olhar, fazê-lo penetrar nos problemas da maioria da humanidade, de tantas populações vítimas de emergências humanitárias que não criaram, mas têm de as suportar, frequentemente, depois de longas histórias de exploração ainda em curso.

O Papa disse que “é fácil arrastar a opinião pública incutindo o medo do outro”.

Mas por que motivo não se fala, com o mesmo brio, da exploração dos pobres, das guerras esquecidas e muitas vezes lautamente financiadas, dos acordos económicos feitos na pele do povo, das manobras ocultas para contrabandar armas e fazer proliferar o seu comércio? Por que motivo não se fala disto? Há que enfrentar as causas remotas, não as pessoas pobres que pagam as suas consequências, acabando até por ser usadas para propaganda política.

Para remover as causas profundas, não basta apenas resolver as emergências. São necessárias ações concordadas. É preciso abordar as mudanças epocais com grandeza de visão, porque não há respostas fáceis para problemas complexos. Em vez disso, impõe-se acompanhar os processos a partir do seu interior para superar os guetos e favorecer uma integração lenta e indispensável, para acolher de modo fraterno e responsável as culturas e as tradições alheias.

Olhar para as crianças

Nesse sentido, o Papa afirmou que, “se queremos recomeçar, olhemos sobretudo os rostos das crianças”.

Tenhamos a coragem de nos envergonhar à vista delas, que são inocentes e constituem o futuro. Interpelam as nossas consciências, perguntando-nos: «Que mundo nos quereis dar?» Não fujamos apressadamente das cruas imagens dos seus corpinhos estendidos, inertes, nas praias. O Mediterrâneo, que uniu durante milénios povos diferentes e terras distantes, está a tornar-se um cemitério frio sem lápides. Esta grande bacia hidrográfica, berço de tantas civilizações, agora parece um espelho de morte. Não deixemos que o mare nostrum se transforme num desolador mare mortuum, que este lugar de encontros se transforme no palco de confrontos. Não permitamos que este «mar das memórias» se transforme no «mar do esquecimento». Por favor, irmãos e irmãs, paremos este naufrágio de civilização!

Compaixão e misericórdia

O Papa afirmou então que a fé “pede compaixão e misericórdia; não esqueçamos qual é o estilo de Deus: proximidade, compaixão e ternura”.

A fé exorta à hospitalidade, àquela filoxenia que permeou a cultura clássica, encontrando depois em Jesus a sua manifestação definitiva, sobretudo na parábola do bom samaritano (cf. Lc 10, 29-37) e nas palavras do capítulo 25 do Evangelho de Mateus (cf. vv. 31-46). Não é ideologia religiosa, são raízes cristãs concretas.

Jesus afirma solenemente que está ali no estrangeiro, no refugiado, no nu e no faminto. E o programa cristão é encontrar-se onde Jesus está. Sim, porque «o programa do cristão – escreveu o Papa Bento XVI – é “um coração que vê”» (Carta enc. Deus caritas est, 31).

Pedido a Nossa Senhora

O Papa encerrou seu discurso rezando a Nossa Senhora “para que nos abra os olhos aos sofrimentos dos irmãos”.

Ela pôs-Se a caminho apressadamente para ir ter com a prima Isabel, que estava grávida. Quantas mães grávidas, apressadas e em viagem, encontraram a morte enquanto levavam no ventre a vida! Que a Mãe de Deus nos ajude a ter um olhar materno, que veja nos homens filhos de Deus, irmãs e irmãos que devemos acolher, proteger, promover, integrar e… amar ternamente. Que a Toda Santa nos ensine a colocar a realidade do homem antes das ideias e das ideologias, e a mover, rápido, os passos ao encontro de quem sofre.

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