Tenhamos a obra, e sobretudo a vida, de Santo Tomás de Aquino como luz para, de vez, destruir a falácia de que a fé é incompatível com a racionalidade e a lógicaEm sua biografia filosófica sobre Santo Tomás de Aquino, o escritor e filósofo inglês G. K. Chesterton escreveu: “O que impressionava na vida de Santo Tomás era seu amor pelos livros e sua vida dedicada a eles; vivia exatamente como o personagem do acadêmico ou escriba dos Contos de Cantuária (obra de Geoffrey Chaucer, poeta inglês), que preferiria possuir cem livros sobre Aristóteles e sua filosofia a obter qualquer riqueza que o mundo pudesse oferecer”. De fato, o amor de Santo Tomás pelos livros é algo impressionante, haja vista a obra monumental que deixou, tendo vivido em uma época de difícil acesso a livros e sem ter as facilidades modernas da internet e seus sites de busca.
O que é digno de admiração na vida do Doutor Angélico, entretanto, é que, à medida em que ele vai trilhando sua caminhada intelectual, vai encontrando traços de Deus em tudo que experimenta. Quando o pensamento era de que a filosofia grega era inconciliável com a fé cristã, Santo Tomás se coloca a estudar a obra de Aristóteles e mostrar que nessa obra pagã pode-se encontrar bases para um entendimento racional e vivo dos ensinamentos de Cristo. Não existe para ele contradição, mas, sim, a soma de forças para se conseguir entender o imensurável amor de Deus. Penso que o episódio de sua biografia que sintetiza melhor esse seu pensamento da unidade de todas as coisas em Deus seja o embate filosófico com Siger de Brabante.
Apenas uma verdade
Esse filósofo belga, nascido em Brabant, era mestre na faculdade de arte da Universidade de Paris e professava uma doutrina baseada na existência de uma dupla verdade: a verdade do mundo sobrenatural e a verdade do mundo natural. Conforme nos explica Chesterton, Siger de Brabante partiu a cabeça humana em duas e o desenrolar de sua filosofia sutilmente permitiria intuir que existe, então, o campo irracional da fé e o campo racional das ciências. Ora, quem gostaria de ficar do lado do ilógico? Quem quer defender aquilo que não faz sentido? Creio que ninguém. Nesta linha de análise, à medida em que o homem vai se aproximando dos estudos, das ciências e da racionalidade, ele vai tender, cada dia mais, a se afastar de Deus, por ver na fé um balaio de irracionalidade e caos. Não é, afinal, que ainda vemos ser professado a todo momento nas universidades e círculos de pensadores que se dizem modernos?
Para o nosso bem, diante desse erro, Santo Tomás foi contundente e declarou que existe apenas uma verdade, sendo a fé essa única verdade. Deste modo, nada que se venha a se descobrir na natureza pode contradizer a fé e, uma vez que a fé é a verdade única, nada que se venha a deduzir da fé pode contradizer os fatos. Partindo dessa premissa, quanto mais perto dos livros, mais o homem deve se aproximar de Deus, pois o estudo honesto permite encontrar Deus em toda a obra criada e em toda a cultura civilizada. Bebendo dessa fonte, vai declarar o cientista francês Louis Pasteur que “um pouco de ciência nos afasta de Deus. Muita, nos aproxima”. De modo semelhante, o geneticista estadunidense Francis Collins, em seu livro “A Linguagem de Deus: um cientista apresenta evidências de que Ele existe”, chega a semelhante análise por meio de um honesto testemunho de sua vivência com os estudos sobre o genoma humano. Tendo sido ateu convicto, ao inserir-se na grandeza da genética do ser humano e sua complexidade, passou de ateu a cristão convicto aos 27 anos de idade, pois jamais, sem a presença de um logos criador, aquilo tudo poderia existir.
Luz
Tenhamos a obra, e sobretudo a vida, de Santo Tomás de Aquino como luz para, de vez, destruir a falácia de que a fé é incompatível com a racionalidade e a lógica, pois todos os caminhos levam a Deus. Para isso basta ter uma vida intelectual sadia e uma honestidade pura ao analisar a realidade que nos cerca.
Leia também:
A virtude do silêncio, Santo Tomás e o ensinamento monástico
Leia também:
O holocausto e o “vigiai e orai”