O tema de Cabo Delgado esteve em destaque ontem na apresentação em Lisboa do Relatório sobre a Liberdade Religiosa no Mundo da Fundação AIS. Guilherme d’Oliveira Martins, que apresentou o documento, classificou de “dramática” a situação que se vive nesta província no norte de Moçambique, e considerou essencial a cooperação entre todas as organizações presentes no terreno no apoio às populações.
“A situação é dramática e é indispensável que todos ajudem estas populações, designadamente as instituições da sociedade civil e as organizações de base religiosa [que] não podem deixar de ter um papel positivo sobretudo na protecção das pessoas que estão vulneráveis e que são objecto de violência de morte.”
O administrador-executivo da Fundação Calouste Gulbenkian sublinhou durante a sessão de apresentação do Relatório, que decorreu ontem de manhã numa sessão virtual, o papel que o Estado moçambicano deve desempenhar neste conflito causado por grupos terroristas que têm vindo a atacar aldeias, vilas e cidades desde 2017 e que já causaram mais de dois mil mortos e mais também de 700 mil deslocados.
“É indispensável que haja uma intervenção corajosa por parte da Estado moçambicano”, disse Oliveira Martins, acrescentando que “esta questão é absolutamente crucial para não gerar situações de vazio de autoridade”. “Deve haver [também] um apoio da comunidade internacional para que não haja um vazio de autoridade e para que haja a possibilidade efectiva de protecção e de salvaguarda das populações”, disse ainda.
Posição semelhante foi tomada por Catarina Martins de Bettencourt. A directora da Fundação AIS em Portugal enfatizou o papel da sociedade civil e da Igreja no trabalho crucial de apoio às populações deslocadas pelo conflito, lembrando que “Moçambique é um dos países mais pobres do mundo, e as pessoas desta região [de Cabo Delgado] são já de si muito pobres também…”
Catarina Bettencourt lembrou ainda que a Fundação AIS pertence a uma “plataforma de várias organizações que está a tentar fazer um ‘lobby’ positivo no sentido de trazer esta questão para a agenda política de Portugal”, sublinhando ainda o papel que o governo de Lisboa pode desempenhar durante o primeiro semestre deste ano que corresponde à presidência portuguesa do Conselho da União Europeia.
Sobre o trabalho efectivo da Fundação AIS na ajuda humanitária às populações de Cabo Delgado, lembrou que “já no fim do ano passado” foi enviada “ajuda de emergência para a Igreja alimentar, vestir, cuidar destes milhares e milhares de deslocados”, e que sem essa ajuda, que tem de continuar, “podermos assistir a uma calamidade, uma catástrofe humanitária ainda maior”.
O caso de Cabo Delgado foi discutido já na parte final da apresentação do Relatório sobre a Liberdade Religiosa no Mundo, trabalho de investigação produzido a nível internacional pela Fundação AIS. Moçambique faz parte de um conjunto de países retratados a vermelho no Mapa do Relatório por causa da “perseguição” e “discriminação” aos crentes. É um mapa que engloba o Afeganistão, o Bangladesh, mas também a China, Mianmar, Irão, Coreia do Norte, Líbia ou Índia, num total de 26 países. O caso da Índia mereceu comentários por parte de Guilherme d’Oliveira Martins, em resposta a uma questão colocada no final da sessão de apresentação do Relatório. O facto de estar agendada para a cidade do Porto uma cimeira entre a União Europeia [EU] e a Índia, no âmbito da presidência portuguesa, pode ser importante para o debate das questões relacionadas com os direitos humanos.
(Com Fundação AIS)