Os bispos do Chile enfatizaram que matrimônio e união civil homossexual não são a mesma coisa, em resposta às intenções declaradas do presidente do país, Sebastián Piñera, de dar "urgência de lei" ao projeto do assim chamado "matrimônio igualitário". A fala do presidente foi criticada até por partidos políticos que compõem a coalizão de governo, devido à falta de um debate prévio. A oposição também o criticou, acusando Piñera de "oportunismo político".
Em nota de 2 de junho, o Comitê Permanente do Episcopado do Chile (CECh) declarou que o matrimônio é apenas a união entre um homem e uma mulher cuja comunhão cria vida e estabelece a família, e que, por isso mesmo, "não há fundamento" que permita compará-lo com quaisquer outras formas de união, incluindo as uniões civis homossexuais.
A diferença, de fato, não depende de convenções jurídicas, ideológicas ou mesmo religiosas, já que é estabelecida pela própria biologia: a procriação natural da espécie humana depende da união física entre homem e mulher, e, para que os filhos gerados por essa união contem com todos os devidos cuidados e condições familiares, é necessário que essa união seja reconhecida e protegida como específica e diferente de quaisquer outras. Simples assim.
Não há discriminação nenhuma em reconhecer o fato biológico de que a união entre um homem e uma mulher, aberta naturalmente à fecundidade, é completamente diferente de outras formas de união entre indivíduos. Por lógica, também não há discriminação alguma em reconhecer que é razoável utilizar um termo específico para esta forma específica de união, visando não confundi-la com outras. Por justiça, também não se pode alegar discriminação nenhuma em se proteger legalmente essa forma básica, natural e fundamental de união entre mulher e homem, dado que, no mínimo, ela merece o reconhecimento de garantir a preservação da existência da espécie humana.
Além disso, o matrimônio entre homem e mulher já é amplamente encarado com superficialidade, imaturidade e descompromisso por milhões de pessoas no mundo todo, com todas as consequências negativas que isto acarreta na vida das crianças e do próprio casal. Diluir mais ainda a especificidade e a seriedade desta união só piora um cenário já frágil.
A menos que o objetivo seja precisamente o de fragilizar o matrimônio, não há justificativas razoáveis para forçar a sua confusão com outras formas de união que, por natureza, são autoexplicativamente diferentes.
A nota do episcopado chileno, aliás, menciona a exortação apostólica Amoris laetitia, do Papa Francisco, que explicitamente reforça essa diferença básica e rejeita que ela seja comparável a outras modalidades de relacionamento afetivo entre indivíduos:
Os bispos do Chile recordam, evocando o Catecismo da Igreja Católica (nº 1603), que "a vocação ao matrimônio está inscrita na própria natureza do homem e da mulher, tais como saíram das mãos do Criador". Citando ainda o Compêndio da Doutrina Social do Igreja (nº 211), a nota complementa que a família é o "lugar primário das relações interpessoais, célula primeira e vital da sociedade, que nasce da íntima comunhão de vida e de amor fundamentada no matrimônio entre um homem e uma mulher".
Feita esta diferenciação, os bispos acrescentam que estes fatos básicos não contradizem "a firme convicção da Igreja de que toda pessoa, independentemente da sua orientação sexual, deve ser respeitada na sua dignidade e acolhida com respeito, tentando-se evitar qualquer sinal de discriminação injusta".
Por isso mesmo, os bispos chilenos recordam que a legislação nacional do país já estabeleceu um regime que protege legalmente a decisão das pessoas homossexuais que resolveram viver juntas: trata-se do Acordo sobre a União Civil.
Em síntese, o que o episcopado no Chile recorda é uma obviedade para qualquer pessoa que de fato queira reconhecer a realidade sem a interferência da ideologia: que o termo matrimônio se refere a um conceito natural suficientemente importante para as sociedades humanas a ponto de não dever ser confundido com nenhum outro tipo de união. As demais formas de união entre indivíduos podem ser civilmente reconhecidas sem qualquer necessidade de confusão artificial entre termos e conceitos diferentes por natureza.
Foi neste sentido que dom Juan Ignacio González, bispo de San Bernardo e administrador apostólico de Rancagua, afirmou que não é o Estado nem são as confissões religiosas que decidem o que é e o que não é matrimônio.
E é neste sentido que os bispos chilenos encerram a sua nota:
De fato, discernimento é uma boa palavra a ser destacada nesse tipo de discussão, já que, frequentemente, ela é contaminada por ideologias que não distinguem entre fatos objetivos e leituras subjetivas.