Lembremos uma história tão conhecida... Um jovem, um homem solteiro conhece uma jovem donzela, formosa (como se dizia nas antigas). O coração dele bate forte: É ela... esta é a minha escolhida! E sente-se correspondido. Oficializa-se o noivado, alegremente aprovado por ambas as famílias. Daí, os projetos, os sonhos... Quantos filhos? Um casal? Mais... Os que Deus e o amor desejarem... Naquela noite, porém, no sonho, a presença de Rafael... Uma sublime missão muda os planos de José. Homem justo, virtuoso, temente a Deus. É o Messias?! Será!?... Não, sou tão pobre.. Mas esquecer, jogar fora os planos e sonhos?... Dúvidas... Lamento?....
Durante vários dias a voz do arcanjo a ressoar nos ouvidos do carpinteiro de Nazaré. Obra do Espirito Santo... Emanuel... Filho do Altíssimo! Como não poderia ser diferente, a fé venceu a cisma, a desconfiança, sentimentos de corações pequenos. Deus seja servido! Teria felicidade maior? Não, revolta não... Algo indescritível. Caiam vaidades, desejos carnais... Isso é possível aos pobres mortais? Sim, mas somente a quem ama. A quem se entrega à justiça divina.
E Jesus Cristo, o filho do Altíssimo, teve um pai humano. E que pai e chefe de família exemplar foi José! Esmerava-se em amor na sua casa. Continuou aberto a todas as orientações angelicais, para salvaguardar o menino, para que Ele, o Filho de Deus, pudesse crescer e cumprir o seu Evangelho. “E Jesus crescia em sabedoria, tamanho e graça, diante de Deus e dos homens” (Lc 52:2).
A rede social de oração Hozana e a Comunidade Shalom propõem nove dias de meditação orante com São José, refletindo sobre o seu papel paterno na Família de Nazaré. Rezaremos pelos pais de forma especial, pedindo a Deus para eles, a cada dia, uma virtude do pai adotivo de Jesus. Clique aqui para participar da novena.
“Com o coração de pai” José amou Jesus. Assim começa a carta apostólica do Papa Francisco por ocasião do 150º aniversário da declaração de São José como santo padroeiro da Igreja universal.
Então... Como seria o mundo, se nós, os pais, imitássemos a José, se nossas famílias fossem como aquela de Nazaré?... Que bela a inspiração a do Pe. Zezinho, que a isto nos conclama, com palavras simples e diretas (“Estou pensando em Deus”):
Tudo seria bem melhor
Se o Natal não fosse um dia
E se as mães fossem Maria
E se os pais fossem José
E se a gente parecesse
Com Jesus de Nazaré
É impossível a um cristão falar de pai, sem referência ao Chefe da Sagrada Família, que se abriu confiante à vontade do Pai do Céu. E eu conheci de perto um pai que, ouso dizer, o imitava, ou teve atitudes assemelhadas. E me utilizo da saudade de meu pai, do enaltecimento honesto de sua vida, dedicada ao serviço de Deus, da família e do próximo, para homenagear aqueles que se abrem à paternidade, responsavelmente. Afinal é o exemplo que posso mostrar, com fidedignidade. Um exemplo que gostaria de ter seguido. Ele, José Henrique. Eu, José Olímpio. Que boa ideia das mães, na escolha dos nomes! Mas, quem me dera imitar-lhe... Não que me considere um mau pai. Mas, no comparativo, reconheço, fico muito a desejar.
Gestos e fala de permanente meiguice e desapego. Quem o conhecia facilmente confirmava a simpatia que ele inspirava já ao primeiro contato.
A deficiência visual e auditiva não o impediam de manter em casa interessantes colóquios com as pessoas de maior nível cultural do lugar. “Preciso pôr em dia o meu francês” – assim, o pároco costumava justificar suas idas a nossa casa.
Além de escrivão do Registro Civil, apresentava várias outras habilidades de ofício (pedreiro, carpinteiro, funileiro, alfaiate...), que exercia por prazer, quase sempre domesticamente, nos raros momentos de folga. Segundo minha mãe, foi ele o construtor da primeira ponte de Itapebuçu sobre o Rio São Gonçalo do Amarante, na antiga BR-020. (Nosso Itapebuçu é um distrito de Maranguape, cidade do Ceará, berço do humorista Chico Anísio,) Eu próprio, pequenino, me lembro de vê-lo construindo uma casa ao lado da nossa, o próprio manejando a picareta, cavando os alicerces. E, mais crescido, impressionava-me com seus trabalhos de funilaria. O flandre das latas de leite e de querosene era habilmente transformado em copos, leiteiras, lamparinas e outros utensílios de cozinha. Uma tesoura, um martelo, um alicate e um ferro de soldar manual eram os instrumentos.
Apesar da curta convivência – eu tinha treze anos, quando o Pai o chamou – há muito o que recordar. Um banho de cuia, na cacimba do rio seco, de manhãzinha... eu, pequeno e feliz, segurando sua mão... Todas as manhãs, ele, católico fervoroso e vicentino, participando da santa eucaristia.
No canto da sala de visitas, arejada, porta e janela abertas para a calçada da rua, naquela mesa... na sua mesinha exclusiva, ele escrevia... Os papelotes escritos eram acondicionados em pequenas caixas retangulares de madeira, confeccionados por ele próprio. Caixotes que eram arrumados, numa das prateleiras da estante, que continha, também, alguns livros, revistas, e sua caneta-tinteiro.
Ai, como lembro! Na nossa primeira mudança para Fortaleza, vendo que mamãe não apoiava a ideia, tentou convencer-me: “Meu filho, leve este material, não deixe sua mãe jogar fora... Isto vai ser importante pra você! São pesquisas de vida de santos e curiosidades!...” Comovo-me demais, ao recordar a cena, embora, com nove anos, não estivesse à altura de compreender que, naquela ocasião, estava sendo descartada importantíssima produção, fruto de aplicada pesquisa. Um golpe na santa vaidade do intelectual; contudo, jamais reclamara, foi um de seus desapegos. Este quadro vem-me com emoção mais forte quando escuto a bela e tão significativa composição Naquela Mesa, de Sergio Bittencourt, especialmente estes versos:
Eu não sabia que doía tanto
Uma mesa num canto, uma casa e um jardim
Se eu soubesse o quanto dói a vida
Essa dor tão doída não doía assim
Agora resta uma mesa na sala
E hoje ninguém mais fala do seu bandolim.
Naquela mesa 'tá faltando ele
E a saudade dele 'tá doendo em mim
Naquela mesa 'tá faltando ele
E a saudade dele tá doendo em mim.
Aspectos e situações do cotidiano familiar, como os que ora relato, marcaram-me profundamente... Tudo relembro da nossa curta convivência. Oh, meu Deus! Aquele sábado de Aleluia... Eu era apenas um adolescente. Na véspera já o observáramos em animados diálogos com o padrinho Otávio e outros amigos seus, já finados.
Por volta das 8 e meia da noite, recusando com suavidade a colher de chá que minha mãe insistia em colocar em sua boca (“Não carece mais, minha filha...”), entre bocejos e um trejeito de quem esboça sorriso, partiu. Restou-me a visão de um olhar sereno, uma orientação mansa, lábios de leve e permanente sorrir, o andar insone pela casa madrugada adentro... Gestos e atitudes que me chegam, teimosos, vivíssimos, em sequência indefinida e sem controle, de vez em quando, em tela projetada por minha mente.
Naquele instante estava deixando a morada terrena um cidadão cônscio, paciente e de diálogo fácil, um esposo afetuoso e devotado, um católico convicto... Mas, principalmente, um pai que assumiu a missão com amor e desapego. Meu Pai foi, de fato, bem mais que um grande carismático, foi um exemplo de vida. E, mirando São José, me deixou esta verdade como legado: Ser pai é, antes de tudo, uma missão a serviço do amor...
José Olímpio de Sousa Araújo, pelo Hozana