Um teste de transplante de rim de porco em um ser humano foi realizado com sucesso nos Estados Unidos. Devido à complexidade e ao caráter ainda incipiente do procedimento, o teste foi feito com um paciente que, infelizmente, havia sofrido morte cerebral. Além disso, o órgão do porco foi geneticamente modificado para evitar rejeição.
Teste promissor com transplante de rim suíno para humanos
Os resultados do teste se mostraram promissores e trazem novas perspectivas para as pessoas que lutam contra a insuficiência renal e que, em muitos casos, enfrentam uma longa fila de espera por transplantes de rins humanos.
Os médicos da Langone Health, a faculdade de medicina da Universidade de Nova Iorque, anunciaram na última quarta-feira, 20 de outubro, o primeiro teste da história da humanidade que foi bem sucedido ao transplantar um rim suíno geneticamente modificado para o corpo de um ser humano. O porco sofreu as alterações genéticas para evitar que seu órgão fosse rejeitado pelo corpo humano, ao qual foi ligado por vasos sanguíneos: em poucos minutos, segundo os pesquisadores, o rim passou a funcionar normalmente.
O dr. Robert Montgomery, médico responsável pela pesquisa, declarou ao jornal The New York Times:
"Foi melhor do que esperávamos. Parecia qualquer outro transplante que já fiz, de um doador vivo. Muitos rins doados de pessoas falecidas não funcionam imediatamente e demoram dias ou semanas para começar a funcionar. Este funcionou imediatamente".
O mesmo jornal também entrevistou a dra. Amy Friedman, médica e ex-chefe de transplantes do LiveOnNY. Ela considera o teste como um sinal animador de que, em breve, transplantes do tipo poderão ser feitos de fato em pacientes humanos vivos.
O estudo ainda não foi revisado para publicação em jornais científicos, mas especialistas já se manifestaram esperançosos com os dados preliminares. Entre os próximos passos estarão as avaliações sobre a longevidade do órgão transplantado.
Os médicos responsáveis pelo teste inédito informaram que o paciente que recebeu o órgão suíno era, ele próprio, doador de órgãos, mas, infelizmente, não foi possível destinar nenhuma parte do seu corpo à doação para outros pacientes. Sua família concordou então em autorizar o experimento científico que se revelou promissor.
Transplantes de órgãos: a Igreja tem alguma objeção?
Como critério geral, a Igreja Católica não tem objeção à doação de órgãos em si, e, portanto, nem aos transplantes de órgãos: pelo contrário, a Igreja apoia e faz campanhas favoráveis à conscientização e ao engajamento dos católicos nesta causa que salva vidas.
Entretanto, assim como em qualquer outra prática científica, a doutrina católica evidentemente reforça que os meios utilizados precisam ser acordes à moral, e, neste sentido, contribui com o esclarecimento de princípios fundamentais.
As considerações mais básicas dizem respeito, é claro, à doação de órgãos humanos. O número 2296 do Catecismo da Igreja Católica esclarece que a "transplantação de órgãos é conforme à lei moral se os perigos e riscos físicos e psíquicos em que o doador incorre forem proporcionados ao bem que se procura em favor do destinatário". O mesmo número também elogia o gesto da doação de órgãos de uma pessoa falecida como "um ato nobre e meritório" e como "manifestação de generosa solidariedade".
O critério fundamental para a doação de órgãos humanos, portanto, é o livre e consciente consentimento expresso do doador, sem o qual a doação é moralmente inaceitável. A doutrina católica também reforça que é moralmente inadmissível "provocar diretamente a mutilação que leve à invalidez ou à morte de um ser humano, ainda que isto se faça para retardar a morte de outras pessoas": ou seja, é imoral assassinar ou abreviar a vida de alguém para destinar os seus órgãos a terceiros, por mais que estes precisem de transplante urgente.
Outro critério basilar é que, quando um órgão é proporcionado por um doador ainda em vida, não é moralmente aceitável que a doação comprometa a integridade funcional do seu organismo. Por exemplo: a doação de um rim afeta a integridade anatômica do doador, mas não necessariamente a sua integridade funcional, já que o organismo humano consegue funcionar com apenas um rim saudável. Já a doação de uma córnea por um doador em vida não é moralmente aceitável porque o levaria a perder a faculdade da visão: em tal caso, preponderaria a mutilação, que é imoral, sobre a doação.
Por fim, mas de importância determinante, é obrigatória no tocante a doadores falecidos não apenas a existência do consentimento expresso manifestado ainda em vida, mas também é crucial que os médicos constatem de modo objetivo e comprovável a morte cerebral do doador. Neste quesito, ainda persiste a necessidade de se aprofundar nos critérios empregados para atestar a morte cerebral humana.
E no caso do transplante de rim de porco em humanos?
Em 2001, o Vaticano anunciou não ter objeções morais ou éticas ao transplante de órgãos, tecidos e células animais para seres humanos. A manifestação se deu em resposta a uma consulta do Conselho da Europa, que havia pedido que as diversas confissões religiosas declarassem a sua posição a respeito dos xenotransplantes, que são precisamente os de órgãos animais para seres humanos.
A posição da Igreja foi apresentada pelo monsenhor Elio Sgreccia, vice-presidente da Pontifícia Academia para a Vida, no documento "Perspectiva dos Xenotransplantes, Aspectos Científicos e Considerações Éticas". O documento contou com a participação de especialistas como Emanuel Cozzi, do Departamento de Cirurgia da Universidade britânica de Cambridge, e Maria Luisa Lavitrano, coordenadora de projetos de transplantes de animais na Itália.
Os cientistas ligados à Igreja observaram que a ciência ainda não tem total conhecimento das implicações desses novos procedimentos, cujos estudos, em vários casos, estavam em fase preliminar. Este cenário, apesar dos avanços, continua semelhante após os 20 anos transcorridos desde então, no sentido de que ainda há muitos aspectos a serem estudados e testados.
Mesmo assim, é eticamente justificável aprovar o uso de animais em benefício humano considerando-se que, para a doutrina cristã, Deus criou e colocou os animais e outras criaturas a serviço do homem e do seu desenvolvimento. É por esta mesma razão que se considera ético, aliás, caçar, pescar ou criar animais para serem consumidos como alimentos. O que se deve evitar, como diretriz geral, é a imposição de sofrimento aos animais e a sua morte desnecessária.
No caso do transplante de órgãos de animais para pessoas, mons. Sgreccia enfatizou que, mesmo sendo um procedimento moralmente aceitável em linhas gerais, a questão requer abordagem mais aprofundada para responder a casuísticas. O mesmo vale, por exemplo, também para o caso das células-tronco: em si mesmas elas podem ser usadas, mas há muitas problemáticas ligadas à sua obtenção, sobretudo se procedentes de aborto proposital.
Vale acrescentar que o Vaticano pede especial atenção às implicações éticas dos transplantes de órgãos e tecidos de animais em crianças humanas, já que elas não podem autorizá-los com pleno entendimento. Mesmo nesses casos, a Igreja considera que cirurgias do tipo ainda podem ser aceitas moralmente quando fundamentais para salvar a vida da criança.
São João Paulo II se pronunciou a respeito do transplante de órgãos:
"A doação de órgãos, feita segundo formas eticamente aceitáveis, merece particular apreço", por oferecer "uma possibilidade de saúde e até de vida a doentes por vezes já sem esperança".