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O fascínio e a raiva na juventude

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Francisco Borba Ribeiro Neto - publicado em 20/11/22
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O que é a vida adulta senão nossa tentativa de realizar um projeto esboçado, mesmo que de forma muito idealizada, na juventude?

Quem trabalha na universidade, como eu, vive cercado por jovens. Quando me dou conta disso e olho para eles com particular atenção, me veem à mente uma passagem do sociólogo Karl Manheim, que citando Nietzsche, diz que podemos dizer “Esqueci porque comecei”. Quando li essa passagem, na minha própria juventude, me perguntei como poderia alguém esquecer das razões que o levam a fazer o que faz? Como, imaginava eu, seria vazia uma vida assim! O tempo passou e o espanto foi dando lugar à constatação de que todos nós, muitas vezes, vivemos de modo maquinal, fazendo as coisas porque elas devem ser feitas, sem nos darmos conta de nossas motivações.

Paralelamente, fui entendendo também uma admoestação que o sacerdote italiano Luigi Giussani fazia aos adultos, dizendo-lhes que deviam olhar para os jovens e reaprender com eles: os mais velhos precisam sempre recuperar as razões que os levam a fazer o que fazem – e olhar os jovens pode ser muito útil para uma retomada. Afinal, o que é a vida adulta senão nossa tentativa de realizar um projeto esboçado, mesmo que de forma muito idealizada, na juventude?

A busca por uma vida que valha a pena viver

Sou particularmente fascinado por aqueles jovens que manifestam uma enorme paixão pela vida, que estão buscando obter sempre o máximo de cada situação. Quando eu era jovem, em meu primeiro “retiro espiritual” como universitário, o padre que nos acompanhava, Pigi Bernareggi, disse que seguir a Cristo era nossa possibilidade de abraçar o mundo, com tudo aquilo que tinha de bom e mal. Se não vivêssemos o cristianismo assim, podíamos ir embora, pois a vida cristã era muito exigente para não nos entregar, em retribuição, o mundo inteiro.

Pigi era um cristão extremamente radical e extremo, mas, sempre que encontro esses jovens que parecem explodir com seu desejo de vida, sou obrigado a recordar a grandeza da promessa cristã. Recordar que “o cêntuplo” não é força de expressão, ou objeto de uma contabilidade mesquinha de ganhos e perdas advindos de uma conduta moralmente justa. O cêntuplo é o mundo, quer seja vivido por um papa que é referência para milhões, que percorre o globo em viagens internacionais, quer seja vivida por uma monjinha humilde, que passou sua vida em seu convento, como Teresa de Lisieux.

Ao mesmo tempo, me entristece ver certos jovens “bonzinhos”, que parecem ter perdido o ímpeto da juventude e desde logo se tornam conformistas, se autointitulando realistas ou moralmente bons. É verdade que as explosões de vida juvenis frequentemente se perdem em condutas inadequadas para o próprio desenvolvimento da pessoa, mas negar a busca juvenil por realização, felicidade, prazer e justiça não ajuda a construir um mundo melhor – pode inclusive levar a uma vida arrependida pelas “ocasiões perdidas”.

A frustração com a vida adulta

A pior coisa que um jovem pode dizer para um adulto é “quando tiver a sua idade, não quero ser como você”. Infelizmente, é algo que pode não ser dito, mas é pensado com enorme frequência. Existem casos em que se trata de um julgamento totalmente injusto. O jovem simplesmente não entende as condições de vida do adulto, suas limitações e as formas pelas quais se realiza humanamente mesmo enfrentando essas limitações. Ou então, ainda não viveu certas aspirações típicas da vida adulta, como a paternidade e a maternidade, que implicam num espírito de doação pouco evidente para quem ainda está descobrindo a si próprio. Contudo, muitas vezes esse juízo corresponde realmente a um dado real, à perda das esperanças da juventude, ao conformismo diante das injustiças do mundo, do amesquinhamento do coração como forma de sobrevivência... Ou, pior ainda, em comportamentos autoritários e destrutivos, que oprimem o outro para desafogar as próprias frustrações.

E aqui surge o outro lado da medalha: paralelamente a essas fascinantes explosões de vida encontramos expressões de raiva e desatino igualmente frequentes na juventude. Por que os jovens tantas vezes parecem agir assim? Um dado óbvio e inevitável é que o jovem, ainda não sendo autônomo, frequentemente tem sua vontade contrariada – e ninguém gosta de ser contrariado. Mas não é só isso...

A juventude é o período em que nos damos conta do caráter ilusório de muitos sonhos da infância, que constatamos as contradições do mundo e a fragilidade dos adultos. A perda das ilusões, o medo do fracasso e a falta de perspectivas estimulantes podem levar ao ressentimento e à raiva, a uma ávida e pouco sensata busca pelo prazer e pelo alívio das tensões. Nesse momento, a falta de uma orientação segura e de um modelo de vida adequado se tornam particularmente perigosos.

Um caminho para não se deixar levar por ideologias

A grande questão, tanto para os jovens quanto para os adultos, é não perder a relação com aqueles que são sinal de uma humanidade intensamente vivida, que nos ajudam a reconhecer toda a beleza e a grandeza da existência. Às vezes nos assustamos com o impacto das ideologias sobre a mentalidade dos jovens. Coremos o risco de agir como quem se preocupa em não se contaminar com uma doença, mas não procura fortalecer o organismo... Acaba não pegando uma doença, mas pega outra...

Uma existência bem vivida, a consciência de ter experimentado a riqueza que a vida nos oferece e a liberdade de quem sabe o valor daquilo que está vivendo são as melhores defesas contra qualquer ideologia. Quem sabe como viver, quem conhece verdadeiros mestres de vida, não se deixa levar por ideologias. Quando erra (pois todos somos falíveis e erramos), consegue reencontrar o caminho certo. Já quem não faz a experiência de uma vida que tem sabor, que vale a pena ser vivida, estará sempre sujeito à influência do primeiro ilusionista que lhe oferecer a felicidade que ele anseia, mas não sabe como encontrar.

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