Desde os primórdios do cristianismo, homens e mulheres, que buscavam a Deus e eram atraídos pela proposta de vida anunciada por Jesus Cristo, compreenderam a necessidade de estudar, de aprender a ler e escrever, de se dedicar à leitura e meditação das Sagradas Escrituras, em particular os salmos; mas não só, também de conhecer os grandes autores da literatura clássica e da filosofia grega e as suas descobertas sobre o mundo e o ser humano.
A arte, a música e, em particular, a literatura, eram reconhecidamente necessárias para aprofundar, compreender e viver melhor a mensagem cristã. Dentre esses homens e mulheres se encontravam, em especial, os monges e as monjas. A vida monástica floresce já nos primeiros séculos do cristianismo entre homens e mulheres que se sentiam impelidos a viver com radicalidade uma forma de vida de doação total a Cristo e conforme o seu estilo. Para tanto, organizaram-se em comunidades conforme as Escrituras descreviam as primeiras comunidades cristãs, tendo tudo em comum, celebrando a liturgia e meditando as Sagradas Escrituras. Pode-se dizer, então, como afirma o grande historiador do monaquismo, Jean Leclercq, que o amor às letras e à cultura acompanhou desde sempre o desejo de Deus (cf. J. Leclercq, O amor às letras e o desejo de Deus, Paulus, 2012).
Com este desejo no coração e seguindo a milenar tradição camaldolense, os mosteiros camaldolenses brasileiros da Transfiguração e da Encarnação deram início em 2023 aos Encontros Culturais Camaldolenses, em parceria com a Faculdade de Filosofia e Teologia Paulo VI, da Diocese de Mogi das Cruzes e o Núcleo Fé e Cultura da arquidiocese de São Paulo.
É uma iniciativa pequena e despretensiosa, mas que carrega um grande desejo de oferecer uma oportunidade de encontro e condivisão para todas as pessoas que sentem a necessidade de aprofundar a sua fé, conhecer melhor a proposta de vida cristã e o que ela tem a dizer diante dos desafios contemporâneos. Vale lembrar também que o desenvolvimento cultural de nossa fé não só nos faz crescer humana e espiritualmente, mas dá vigor ao nosso testemunho, no diálogo com diferentes culturas, religiões e experiências humanas.
Estão previstos seis encontros no ano de 2023. No primeiro semestre foram realizados três encontros:
25 de março, A contribuição monástica e da Doutrina Social da Igreja para enfrentar os desafios políticos e culturais atuais, Professores Francisco Borba Ribeiro Neto, coordenador do Núcleo Fé e Cultura da PUC-SP e Ana Lydia Sawaya, monja beneditina camaldolense.
21 e 22 de abril, As Origens do Cristianismo, Professor Innocenzo Gargano, professor dos Institutos Pontifícios Oriental e Bíblico e Universidade Urbaniana em Roma, Itália e monge beneditino camaldolense.
27 de maio, Evangelhos Sinóticos e Evangelho de São João, Professor Maurizio Marcheselli, professor de Teologia da Faculdade de Teologia de Bolonha, Itália.
Os encontros são presenciais, e os vídeos dos encontros serão disponibilizados on-line pela Aleteia a posteriori.
Para o segundo semestre de 2023, os encontros serão:
29 julho, O Teatro e o Sagrado: A máscara e o espelho na arte do encontro, Professor José Maurício Cagno, ator, diretor teatral, dramaturgo e professor de teatro nos cursos de MBA, FUNDACE, FEA, USP-Ribeirão Preto.
26 agosto, Introdução Geral à Bíblia, Professor Luiz da Rosa, criador e responsável pelo site www.abiblia.org, diretor de comunicação do Instituto dos Irmãos Maristas em Roma.
30 setembro, A beleza salvará o mundo: a liturgia e o espaço sagrado, Professor Gabriel Frade, editor assistente das Edições Loyola.
Um pouco da história camaldolense
Os camaldolenses pertencem à grande família dos monges beneditinos. Nascem em 1012 a partir da proposta de reforma monástica de São Romualdo que, profundamente inserido nas dinâmicas da igreja do seu tempo, pretendia renovar a dimensão espiritual na igreja, promovendo a vida solitária em eremitérios e a simplificação da vida comunitária nos cenóbios. Por isso, seus discípulos seguem um estilo de vida simples orientado pela liberdade interior, o amor fraterno e a primazia da procura de Deus, ao mesmo tempo em que formam uma ordem contemplativa aberta às exigências da igreja e da sociedade, com as riquezas e as contradições das suas culturas.
O nome da Congregação surge do eremitério e mosteiro de Camaldoli localizado no alto das montanhas do centro da Itália que é dividido em duas unidades ligadas entre si: um mosteiro de vida cenobítica e um eremitério. Sua forma de vida floresceu ao longo dos séculos a partir de uma realidade tripartite chamada triplex bonum (três oportunidades): a vida cenobítica, a vida eremítica e o apostolado. É característica da vida camaldolense o amor pela cultura, o diálogo interreligioso e a hospitalidade.
No Brasil existem dois mosteiros camaldolenses: o Mosteiro da Transfiguração (1988), comunidade masculina, e o Mosteiro da Encarnação (1994), comunidade feminina. Estão localizados na zona rural do Município de Mogi das Cruzes e, embora sejam dois mosteiros independentes, compartilham do mesmo espírito camaldolense, codividindo frequentemente a liturgia, a lectio divina e as atividades de apostolado. É particularmente cara, aos monges e monjas camaldolenses, a prática da leitura orante da Bíblia (lectio divina) e sua condivisão semanal com hóspedes e visitantes.