Desde pequeno ele queria ser padre. Foi forçado a se fingir de ateu a vida inteira. Casou, foi pai, avô, viúvo. Finalmente, aos 67 anos, conseguiu consumar sua vocação e foi ordenado sacerdote!
O Vatican News publicou em 2019 a surpreendente, inspiradora e emocionante história de vida do pe. Victor Pogrebnii, então com 73 anos de idade e 7 de sacerdócio.
Antes de ser ordenado padre em Kiev, na Ucrânia, em 7 de janeiro de 2012, porém, ele teve que ser militar soviético e, portanto, fingir durante décadas que não acreditava no Deus a quem profundamente amava. Ao longo desse Calvário, no entanto, Deus nunca o abandonou: Ele o enriqueceu com a graça incomensurável de, antes de receber o sacramento da Ordem, receber também o do Matrimônio e experimentar a bênção de ser esposo, pai e avô.
Quando sua esposa, a quem também amava intensamente, foi chamada para a eternidade, o agora viúvo teve a serenidade e a maturidade para discernir que, no fundo da alma, aquele “sim”, que aguardara durante toda uma vida para ser pronunciado perante Deus, poderia finalmente ser dito em voz alta e a plena luz, com o sólido apoio dos filhos e netos: o sim ao eterno sacerdócio de Jesus Cristo.
O vilarejo natal
Slobozia-Rascov é um vilarejo no coração da Transnistria, um território separatista da República da Moldávia. Ao longo dos anos, aquela aldeia foi berço de muitos sacerdotes católicos e até de um bispo, graças à resistência e à resiliência de uma comunidade católica ativa e convicta que não pôde ser derrotada pelo ateísmo compulsório que o regime comunista impôs à região quando ela esteve anexada à União Soviética. Os católicos da pequena Slobozia-Rascov não tiveram medo nem sequer de construir uma igreja sem qualquer autorização, em plena década de 1970, sob a opressão implacável do regime comunista de Moscou.
O exército soviético
O almejo pelo sacerdócio foi violentamente agredido no coração de Victor quando o regime o convocou a servir à marinha militar soviética e, por consequência, o obrigou não apenas a se afastar definitivamente de Slobozia-Rascov, mas também a renunciar, pelo menos formalmente, ao Deus a quem desejava se entregar de corpo e alma.
Responsável e talentoso, Victor cresceu na carreira militar e chegou até os seus graus mais altos. A reviravolta radical, no entanto, não apagou quem ele era:
“Não perdi a fé e mantive tudo o que meus pais me ensinaram. Mas já tinha iniciado a carreira militar, onde era estimado e onde também havia recebido diversas incumbências. Minha vida tinha mudado e também tinha conhecido uma boa moça, que se tornou minha esposa, em 1970. Foi assim que eu cheguei até ao altar, mas para ser um bom esposo”.
A fé na clandestinidade
Viver a fé num regime opressivamente ateu como é o comunismo já é perigoso e difícil para um cidadão comum; para um militar, inserido numa rigorosa estrutura de controle, pareceria quase impossível.
“Passei um momento complicado numa estrutura militar do Polo Norte quando os meus superiores encontraram o texto do Evangelho. E, outra vez, quando a polícia descobriu que eu estava ajudando a construir a igreja da Slobozia-Rascov. Eu fui denunciado e interrogado pelos superiores. Quando eu podia, frequentava uma igreja católica situada diante dos escritórios da KGB. Tinha que tomar muito cuidado para não ser visto. Eu era um católico clandestino. Vivia às escondidas e temeroso. Tentei descobrir se havia algum outro católico entre os meus companheiros, mas era perigoso se expor”.
Uma família feliz
“A minha vida já estava delineada. Eu amava a minha esposa. Da nossa união nasceram dois filhos: depois vieram os casamentos deles e, assim, eu me tornei avô de três netos. Mas também tive a alegria de seguir o caminho do meu irmão, que se tornou sacerdote”.
Quando o pesadelo comunista finalmente desabou, Victor pôde enfim educar os seus filhos abertamente e sem temores na vida cristã. Aposentado na carreira militar, ele vivia uma vida tranquila com a família: esposa, filhos, netos.
Em 2008, sua esposa faleceu.
E como a vida ilumina a morte e a morte ilumina a vida, esse fim de uma etapa e começo de uma nova trouxe à tona, do fundo da alma de Victor, a reflexão sobre a sua vocação inicial: o suave chamado de Deus a ser sacerdote.
Novamente diante do altar
No mesmo ano, o bispo de Kiev o recebeu no seminário. Quatro anos depois, em 7 de janeiro de 2012, Victor caminhou novamente para diante do altar de Deus, agora para receber a unção do sacramento da ordem sacerdotal, sob os olhares de apoio, emoção e alegria dos filhos, dos netos e de outros familiares – inclusive do irmão mais novo, que já era sacerdote fazia vários anos.
“Eu nem sei explicar a emoção daquele momento, e, acima de tudo, aquela imersão com fé no meu passado, quando ainda era jovem, na minha comunidade de Slobozia-Rascov. Além do mais, pensava na minha esposa e na sua felicidade, que ela certamente sentia no céu por esta minha nova escolha. Antes de começar o período de formação no seminário, eu quis conversar com os meus filhos e saber o que eles pensavam sobre a minha decisão. Encontrei neles uma compreensão extraordinária, a ponto de me convencer, ainda mais, sobre esta escolha, que não anulava, de modo algum, o meu passado como esposo e como pai. Pelo contrário: tornava possível realizar uma vocação, que teve de ficar esperando o seu momento e passar pela difícil provação de um regime sofrido”.
Pai de uma nova família
Depois de ordenado, o agora padre Victor foi encarregado pelo bispo de Kiev de ajudar na pastoral de algumas paróquias. Ele agora se tornava pai mais uma vez: de uma ampla família de fiéis a quem se dedicava com a juventude interior de um sacerdote feliz.
Destroços do passado
Victor tinha, no entanto, um passado concreto: o de militar soviético e cidadão russo. Como as relações entre a Rússia e a Ucrânia se deterioraram dramaticamente até explodirem no conflito que levou à anexação da Crimeia pelos russos e à presente guerra civil ucraniana, o padre Victor teve de sair de Kiev e se refugiar na Crimeia agora russa. O bispo de Odessa, nesse território, lhe confiou uma paróquia em Sinferopol.
Deve-se registrar que a reação da Ucrânia é compreensível quando se levam em conta os abomináveis horrores a que o seu povo foi submetido pelo regime comunista soviético.
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O desejo do regresso
No início de 2019, aos 73 anos de idade, o sacerdote sentiu com força o desejo de resgatar as suas raízes e voltar para a sua terra natal, a pequena Slobozia-Rascov.
Dom Anton Cosa, bispo de Chişinău, a capital da Moldávia, deu a respeito do pe. Victor este depoimento retumbante:
“Fiquei comovido com a história deste sacerdote e do seu desejo de voltar à aldeia de Slobozia-Rascov, sua comunidade de origem. Convidei-o para me visitar e conversar, conviver alguns dias, e apresentá-lo ao clero da minha diocese. Notei que aquele homem, tão provado pela sua longa e dolorosa história, se sentia feliz de se doar e testemunhar a sua experiência sacerdotal. Percebi que ele trazia poucas coisas consigo, segundo o espírito da essencialidade de um soldado, mas tinha o coração grande e prestativo de um sacerdote e pai”.
Logo nos primeiros dias da sua estada em Chişinău, o pe. Victor quis ir até Slobozia-Rascov para visitar o túmulo dos seus pais. Era lá, e era junto deles, que o menino de tantas décadas atrás tinha sentido o primeiro desejo de ser sacerdote. Era lá, e era junto deles, que tinha começado a sua extraordinária peregrinação por esta vida, uma jornada que, ao longo de muitos anos e através de muitos lugares, o levara a viver um acúmulo de experiências que, finalmente, o devolviam agora à origem da sua vida, da sua fé e da sua vocação.
Entre fotos de soldado e fotos de sacerdote, o mosaico de uma mesma vida
Ao folhar o seu álbum de fotos, em que os uniformes militares e os paramentos litúrgicos convivem num tocante mosaico da mesma história de vida, o septuagenário padre Victor comenta, com comoção, que, na vida de fé, é preciso deixar-se surpreender pelo bom Deus.
“Agora eu volto para reencontrar o bispo de Odessa e apresentar o meu humilde pedido para regressar ao torrão natal da minha família. E, se Deus quiser, vou arrumar as minhas poucas coisas e voltar para casa, na Slobozia-Rascov. Como o velho Simeão, eu vou poder dizer: ‘Agora, Senhor, deixa o teu servo ir em paz’. Eu sei que, lá, o bom bispo dom Anton Cosa, ao qual confiei a minha história, está me esperando. Com a sabedoria do bom pastor, ele vai dar a este padre, apesar da sua idade, um cantinho para continuar a ser um bom sacerdote”.
Que, pelos Seus caminhos insondáveis, Deus conduza o seu bravo e fiel soldado à abundância de frutos de vida e santidade.
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