O Comitê dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais das Nações Unidas (ONU) está expressamente pressionando o Brasil para que "reveja sua legislação criminal que proíbe o aborto", a fim de, segundo o próprio comitê, "torná-la compatível com a integridade, autonomia e saúde das mulheres, em particular descriminalizando o aborto".
Com os conhecidos eufemismos que relativizam o livre extermínio de bebês em gestação embutindo-o na categoria elástica dos alegados "diretos sexuais e reprodutivos", o comitê exorta o governo brasileiro a "orientar-se" de acordo com o "comentário geral do Comitê nº 22 (2016) sobre o direito à saúde sexual e reprodutiva e as Diretrizes da Organização Mundial da Saúde sobre o Aborto (2022)".
A 74ª Sessão do Pacto Internacional sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais foi realizada de 25 de setembro a 13 de outubro em Genebra, na Suíça. Ficou explícita, no seu decorrer, a pressão pró-aborto aplicada ao Brasil, cuja delegação foi encabeçada por Rita Oliveira, secretária executiva do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC). Durante o evento, 18 assim descritos "peritos da ONU" sabatinaram a delegação brasileira com questionamentos sobre as políticas de direitos humanos e sociais no país.
As "recomendações" da ONU ao Brasil
Encerrado o encontro, o Comitê dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais da ONU publicou, nesta terça-feira, 17, as suas observações finais dirigidas ao Brasil.
O documento registra que o comitê estaria "preocupado" com os "obstáculos que as mulheres [brasileiras] enfrentam para obter acesso ao aborto seguro, mesmo nos casos em que ele é legalmente permitido, particularmente para as mulheres que enfrentam formas de discriminação variadas".
Menciona-se ainda uma preocupação com as "altas taxas de mortalidade materna e com a falta de acesso a serviços de saúde sexual e reprodutiva apropriados e a informações em áreas rurais e periféricas".
Com essa ambientação, o comitê pressiona abertamente o governo brasileiro a assegurar "a acessibilidade e a disponibilidade de serviços e informações de saúde sexual e reprodutiva adequados e de boa qualidade, inclusive o acesso a serviços de aborto seguro, incluindo medicamentos para aborto, contracepção e contracepção de emergência, para todas as mulheres e meninas adolescentes que fazem parte desse Estado, especialmente em áreas rurais ou remotas".
Delegação do governo brasileiro também se mostra pró-aborto
A delegação enviada pelo atual governo federal se mostrou bastante alinhada com a ideologia pró-aborto escancarada pelo comitê da ONU.
Em 29 de setembro, os membros da delegação declararam ao comitê que entre as "principais prioridades do Ministério da Saúde" está precisamente a de "melhorar a saúde sexual e reprodutiva" das brasileiras. Acrescentaram que, em vista deste objetivo, o ministério está "criando medidas para melhorar o acesso à contracepção e ao aborto legal", bem como para "lidar com o preconceito enfrentado pelas mulheres que se submetem ao aborto".
A delegação também destacou que "o Brasil abandonou a Declaração do Consenso de Genebra sobre a Promoção da Saúde da Mulher e o Fortalecimento da Família" já em 17 de janeiro deste ano, transcorridas nem sequer três semanas do governo de Luiz Inácio Lula da Silva. O abandono do anterior compromisso brasileiro com o direito do nascituro à vida seria em favor de "um atendimento de saúde abrangente e baseado em direitos para as mulheres", afirmou a delegação.
Os representantes do atual governo brasileiro também recordaram ao comitê da ONU que, "em setembro de 2023, uma ação questionando a constitucionalidade da legislação penal sobre o aborto foi apresentada ao Supremo Tribunal Federal a pedido de sua presidente [ndr: então a ministra Rosa Weber, hoje aposentada], que se declarou a favor da descriminalização dos abortos realizados nas primeiras 12 semanas de gravidez".
Pressão da ONU chega aos detalhes
O comitê da ONU continuou incisivo na sua pressão pró-aborto.
Uma das suas integrantes, Julieta Rossi, insistiu para que a delegação brasileira detalhasse "quais medidas" estão sendo aplicadas pelo país a fim de "garantir o acesso efetivo ao aborto seguro e não punível, particularmente para as mulheres pobres e negras". Ela também inquiriu pontualmente se já foi tomada "alguma medida legislativa específica" para "descriminalizar o aborto".
Por fim, chegou ao grau de detalhamento de mencionar drogas abortivas pelo nome ao perguntar se o Brasil vai "alterar as legislações existentes" que restringem o acesso a "medicamentos para o aborto seguro, incluindo misoprostol e mifepristone". Segundo ela, trata-se de "um dos métodos mais importantes e seguros para interromper a gestação em todo o mundo".