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Posso ser católico e ter dúvidas doutrinais?

D. Carlo Molari - publicado em 21/01/13

Ter dúvidas sobre alguns aspectos da doutrina da Igreja me torna "menos" católico? Para ser um bom fiel devo acreditar em tudo de cara, sem questionar nada?

As dúvidas são parte integrante da caminhada na fé, mas não são um impedimento. O componente doutrinal da fé muda constantemente na nossa existência. O essencial para a fé é continuar confiando em Deus, de maneira que sejamos capazes de perdoar fiando-nos d'Ele, e amar de um novo jeito, pensar de um novo jeito.

As dúvidas fazem parte necessária do caminho de fé, mas não são um impedimento para o exercício da fé. De fato, a fé primeiramente consiste em entregar-se "total e livremente a Deus, oferecendo-lhe o obséquio pleno da inteligência e da vontade", como afirma o Concílio Vaticano II na Constituição sobre a Revelação (Dei Verbum, 5).

Essencial para a fé é continuar confiando em Deus em todas as situações da existência, de modo a chegar a pensar de maneira nova, amar de maneira nova, perdoar fiando-nos d'Ele etc.

Os modelos bíblicos da fé não se distinguem tanto pelo conhecimento da verdade, e sim pela obediência a Deus; caracterizam-se pela escuta confiante da Palavra de Deus e pelo cumprimento da sua vontade. Assim, de Abraão se diz que "partiu sem saber para onde ia" (Heb 11, 8) e, de Maria, Lucas afirma que ela não conseguia compreender as palavras do seu Filho, mas "conservava todas estas palavras, meditando-as no seu coração" (cf. Lc 2, 50s); ela estava sempre pronta para repetir: "Eis aqui a serva do Senhor: faça-se em mim segundo a tua palavra" (Lc 1, 38).

O componente doutrinal da fé é necessário porque não podemos agir sem pensar, mas o nosso raciocínio segue a experiência e é sempre mediado por padrões culturais que podem mudar radicalmente com a idade, com novas descobertas científicas e com as experiências acumuladas ao longo do caminho.

Nenhum de nós, por exemplo, mantém como adulto a imagem de Deus que teve quando era criança, adolescente ou jovem. Para adquirir uma nova imagem, tivemos necessariamente de colocar em dúvida a imagem anterior e, em seguida, substituí-la.

Não apenas como doutrina, mas também como atitude vital, a fé é um processo pessoal e histórico que requer ajustes contínuos. Não se pode, portanto, pensar que dinâmicas significativas em um determinado período da própria existência ou da história mantêm a sua validade para sempre.

Finalmente, a doutrina da fé não tem como objeto o conhecimento da realidade de Deus, e sim a certeza vital de um Deus conhecido como desconhecido. O caminho da fé deve se desenvolver na convicção de que o nosso modo de interpretar a existência humana e o mistério de Deus é sempre inadequado e imperfeito. Sendo assim a nossa visão de mundo sempre entrará em crise, será atravessada por dúvidas para ser atualizada.

Portanto, é possível testemunhar a própria experiência de fé ainda quando existem dúvidas sobre o conteúdo da doutrina que a exprime. A única coisa que nunca deve faltar é o amor, exercido em todas as situações, na certeza de que "nenhuma criatura poderá separar-nos do amor de Deus em Cristo Jesus, nosso Senhor" (Rm 8, 39).

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