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Os gritos de Nina e o príncipe feliz

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Carlos Zapata - publicado em 26/06/13

O desafio de amar um idoso com Alzheimer

Durante a minha infância, eu costumava devorar livros de contos: assim, tornei-me amigo dos irmãos Grimm, até situá-los entre meus favoritos junto aos clássicos russos de Charles Perrault. Mais tarde, chegaria às minhas mãos uma seleção de obras de Oscar Wilde, de cujos trabalhos um me cativou de maneira especial: "O príncipe feliz".

O homenzinho da realeza, de Wilde, tinha a particularidade de ser feliz porque vivia em um palácio, cujos muros eram tão altos, que lhe impediam de ver a pobreza oculta atrás deles.

Na comovente história, o príncipe derruba esses muros e, sendo rico, se faz pobre, até que, com sua pobreza, ele enriquece seu povoado, dando-lhe a única coisa de valor que tinha: seu coração.

Há pouco tempo, Bento XVI nos presenteou com seu best-seller "Jesus de Nazaré", uma explicação de como a segunda Pessoa da Santíssima Trindade se "abaixa" até a nossa pobreza espiritual, para elevar-nos até a riqueza que se pode alcançar em seu reino, uma vez que ressuscitemos para uma vida definitivamente melhor.

A chave, em ambas as histórias – o conto de Wilde e a teologia do Papa emérito – é, sem dúvida, o amor. Um amor que hoje ainda é como um grito que clama aos ouvidos surdos de uma sociedade que construiu muros onde antes havia liberdade.

Em cada um dos nossos povos há casas que servem como refúgios de silêncio. Mas, quando entramos nelas, tão cercadas de altas paredes e densa vegetação, descobrimos com tristeza que, na verdade, são prisões.

É assim que estas cinzas gerações "modernas" resolvem o estorvo dos seus idosos: fecham-nos em asilos suficientemente isolados para que os gritos dos avós não os alcancem, para que sua consciência não lhes peça um pouco de atenção a uma valiosa parcela da sociedade: os idosos.

Lá, escutam-se os gritos de Nina e Ana Luísa. E cada choro é um ensinamento. Mais que isso: uma oração.

Nina é uma das cem. Ela é chamada assim, ainda que ninguém saiba realmente se este é mesmo o seu nome. Ela, como tantos, sofre de esquizofrenia, paranoia e demência senil. Mas não é preciso ser especialista para compreender o que lhe acontece nem o que ela sente.

A um idoso abandonado, a uma criança autista, a um pobre de carinho não é preciso isolar, porque sua amizade não nos contamina, mas nos salva; com ela, as pessoas não morrem, mas despertam!

Há duas maneiras de "controlar" um esquizofrênico: uma delas é sedá-lo com drogas para que "descanse"; outra, abraçá-lo. Porque ele é como uma criança depois de um pesadelo. Ambos, de fato, acreditam ver fantasmas.

Essas pessoas enxergam coisas que nós não podemos ver. Escutam barulhos que nossos ouvidos desconhecem. Percebem sensações que nos são alheias. Seu cérebro e seu coração, tão complexos, nos desafiam a compreendê-los por meio da linguagem que quebra barreiras: o amor.

Assim, descobrimos que:

Nina grita quando tem medo.

Nina grita quando sente frio.

Nina grita quando se sente sozinha.

Nina grita porque sente dor.

Nina grita… porque não sabe se expressar de outra maneira!

Queira Deus que, quando Nina sentir fome, sede, frio, calor ou medo do novo, ela nos encontre prontos para dar-lhe um abraço; este é um tratamento gratuito, um remédio simples que não exige divisões, uma companhia que se torna oração.

Tomara que os gritos de Nina e de Ana Luísa nos despertem do encanto profundo em que sucumbimos, como o cego príncipe feliz; então saberemos derrubar os muros que nos separam deste nobre tesouro que são nossos valiosos avós.

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