Entenda o que está em jogo: os conceitos de “vida humana” e “democracia” estão prestes a enfrentar um momento crítico e precisam de reforçosNesta sexta-feira, 3 de agosto, e na segunda, dia 6, o Supremo Tribunal Federal (STF) promove audiência pública sobre a descriminalização do aborto no Brasil até a 12ª semana de gestação. Por “descriminalização”, entende-se que o aborto seria legalmente livre durante os primeiros 3 meses da gravidez, independentemente de motivo: bastaria apenas a decisão da gestante para executá-lo. O Sistema Único de Saúde (SUS) realizaria o aborto na rede pública.
Entenda o que será essa audiência:
O conteúdo da audiência
- Esta audiência pública é uma etapa dentro do processo que analisa a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 442, ajuizada pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL).
- As ADPFs visam solucionar dúvidas a respeito da interpretação de uma determinada lei, de modo a julgar a sua constitucionalidade.
- O PSOL questiona, nesta ADPF, os artigos 124 e 126 do Código Penal Brasileiro, que criminalizam a prática do aborto no país. Para o autor da ação, os dispositivos questionados ferem princípios constitucionais como a dignidade da pessoa humana, a cidadania, a não discriminação, a inviolabilidade da vida, a liberdade, a igualdade, a proibição de tortura ou o tratamento desumano e degradante, a saúde e o planejamento familiar das mulheres e os assim chamados “direitos sexuais e reprodutivos”.
A sombra da ideologia e da subjetividade
- O que será discutido, portanto, são interpretações subjetivas e ideológicas. E o caráter subjetivo e ideológico da arguição do PSOL fica evidente já no contrassenso de alegar que o aborto, que é o extermínio de um bebê em gestação, seria um recurso legal para garantir justamente a inviolabilidade da vida (!)
- A se questionar: interpretações subjetivas e ideológicas podem determinar o julgamento de algo tão objetivo quanto a inviolabilidade de toda vida humana em qualquer dos seus estágios? É aceitável que conceitos objetivamente científicos, como a formação de um embrião, sejam relegados a segundo plano diante de interpretações meramente ideológicas? Há algo de científico em alegar que um ser humano não é um ser humano até que se complete um prazo convencionado por opiniões de legisladores ou de juízes pressionados por agrupações ideológicas? Há algo de científico em alegar que, antes do prazo “mágico” de 12 semanas, o que estava em gestação era um ente de outro gênero que não o humano? É mesmo constitucional atribuir a quem quer que seja o “direito” de eliminar um ser humano, inclusive por mero voluntarismo, e ainda alegar que essa eliminação é um ato de proteção à inviolabilidade da vida?
A sombra do ativismo judicial
- O peso da subjetividade e da ideologia nesta discussão se mostra ainda mais grave quando se considera que não cabe ao STF transformar a Constituição, mas sim salvaguardá-la tal como ela foi promulgada. Portanto, está em jogo nesta ADPF, além da relativização interpretativa do que é a vida humana, também o próprio conceito de democracia, cuja essência exige que não haja ninguém com poderes absolutos. No entanto, não há hoje no Brasil nenhuma autoridade que possa fiscalizar os ministros do STF – nem mesmo caso eles cedam a arguições subjetivas e ideológicas claramente contraditórias, como a que alega que matar um bebê seria respeitar a inviolabilidade da vida.
- Quando juízes cedem a ideologias, eles se rebaixam ao mero ativismo judicial. A este respeito, são úteis o seguintes vídeos da série “Ativismo Judicial é Crime“:
– Episódio 32: Assista aqui
– Episódio 33: Assista aqui
– Episódio 34: Assista aqui
A audiência
- A ministra Rosa Weber, como relatora da ADPF 442, convocou em março a audiência que está prestes a se realizar nestes dias 3 e 6 de agosto. Segundo a ministra, esta discussão é um dos “mais sensíveis e delicados” temas jurídicos, já que envolve razões e motivos de ordem ética, moral, religiosa e de saúde pública, além da tutela de direitos fundamentais individuais.
- A audiência acontecerá na sala de sessões da 1ª Turma do STF. Pela manhã, começará às 8h20 e, pela tarde, às 14h30.
- Haverá transmissão ao vivo pela TV Justiça, pela Rádio Justiça e pelo canal do STF no YouTube.
Os participantes da audiência
- Segundo Rosa Weber, houve mais de 180 pedidos de habilitação de expositor na audiência, desde pessoas físicas com potencial de autoridade e representatividade até organizações não governamentais e institutos específicos, envolvendo entidades da área de saúde, institutos de pesquisa, organizações civis e instituições de natureza religiosa e jurídica.
- Cada representante das entidades habilitadas terá 20 minutos para a sua exposição.
- As duas sessões da audiência pública (3 e 6 de agosto) reunirão mais de 40 representantes de diversos setores envolvidos na discussão do aborto, entre instituições e organizações nacionais e internacionais – inclusive algumas ligadas a poderosos conglomerados mundiais da indústria do aborto, como a rede norte-americana Planned Parenthood, acusada de tráfico de órgãos e células de bebês que foram mortos em sua vasta cadeia de clínicas de aborto.
- Os participantes da audiência exporão informações e pontos de vista sobre o aborto, tanto contra quanto a favor – e, a julgar pelo histórico, tanto reais quanto descontextualizados e manipulados.
- Entre os expositores estarão representantes do Ministério da Saúde, da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), da Academia Nacional de Medicina, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), do Conselho Federal de Psicologia e da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).
De parte de bispos da Igreja Católica, recomendamos a leitura das seguintes manifestações já publicadas:
Leia também:
CNBB: Nota de Repúdio ao STF contra tentativa de descriminalizar o aborto
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Legalização do aborto livre no STF: bispos brasileiros convidam à resistência
Para aprofundar:
Leia também:
4 questões sobre o aborto – Parte 1: “Problema de consciência”?
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4 questões sobre o aborto – Parte 2: “Crianças não queridas”?
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4 Questões sobre o aborto – Parte 3: É válido argumentar que “ninguém aborta por gosto”?
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4 Questões sobre o aborto – Parte 4 (Final): “Aqui mando eu”