Aleteia logoAleteia logoAleteia
Terça-feira 21 Março |
São Serapião de Tmuis
Aleteia logo
Atualidade
separateurCreated with Sketch.

4 Questões sobre o aborto – Parte 3: É válido argumentar que “ninguém aborta por gosto”?

Monumento al niño no nacido – pt

© DR

Pe. João Paulo Pimentel - publicado em 09/03/17

À primeira vista, o argumento parece ter certa lógica. Mas há várias objeções a essa lógica.

Os defensores da legalização do aborto afirmam que nenhuma mulher faz ou fará um aborto de ânimo leve.

À primeira vista, o argumento parece ter certa lógica. Praticar o aborto do próprio filho não é o mesmo que injectar heroína. Apesar de a droga arruinar a saúde do consumidor, é preciso reconhecer que um aborto não se situa no mesmo plano: por melhor que seja um Centro de Saúde, nenhuma mulher recorre ao aborto por gosto. Por isso, ninguém deve insinuar que a legalidade incentiva ao aborto por motivos banais. Serão sempre casos de “absoluta necessidade”.

Não tenho receio em concordar que ninguém, com um mínimo de estabilidade mental, recorre a uma cirurgia, do tipo que for, por gosto.

Porém, levanto três objecções ao argumento:

1) A mesma sequência de raciocínio – quando se despenaliza uma acção que por si mesma é desagradável não se prevê um aumento considerável de acções desse tipo – poderia então ser aplicada a outros casos. Pensemos no atropelamento. Se houvesse uma lei a despenalizar os automobilistas que atropelassem pessoas, não é previsível que a maioria dos condutores se dedicasse a passar com o carro por cima dos transeuntes: ninguém ocasionaria com gosto lesões a terceiros (e consequentes amolgadelas no carro…). Significa, então, que a lei sobra? Há até casos de homicídios involuntários por atropelamento com penas que não são nada leves. Não seria de declarar a inocência dos condutores, visto que não atropelaram ninguém de ânimo leve e já lhes basta a tortura da própria consciência? E, mesmo em caso de homicídios voluntários, exceptuando, porventura, a participação em organizações terroristas ou mafiosas, quem mata não o faz levianamente: pesou os prós e os contras e concluiu que o assassinato era a melhor maneira de resolver a questão (leiam-se os romances de Agatha Christie, tão instrutivos nesta matéria quanto a motivações). Será de restringir a penalização do homicídio a casos manifestamente compulsivos ou repetitivos?

Outro exemplo: lembrando os filmes do farwest, e admitindo que algo de verdade neles exista, os cidadãos defendiam-se com as pistolas. A maioria não dispararia sobre um adversário de ânimo leve. Mas foi considerado um avanço da civilização não prosseguir com esse tipo de justiça. O debate sobre a liberalização das armas prossegue nos EUA, mas a convicção generalizada parece desaconselhar uma facilidade em adquiri-las. E, certamente, na Europa, esta questão está resolvida. Por quê? Posso assegurar, da parte das centenas de pessoas que conheço, que tivessem elas uma arma e nunca a usariam levianamente. Vamos então mudar a lei, despenalizando indiscriminadamente o porte de armas? E quando um polícia fere alguém com uma arma, certamente não o fez por gosto; mesmo assim, é exigido habitualmente um inquérito cujo desfecho pode não ser nada favorável para o agente em questão. Por quê? Em resumo: o argumento não colhe. O facto de o aborto ser algo que repugna a quem o pratica não torna supérflua a sua proibição. Mesmo que a mulher decida abortar por razões que considere ponderosas, a sociedade tem o direito de as considerar sempre menos decisivas que a vida do feto, que, por si só, é uma razão suprema.

Omito, para não me alongar, o raciocínio que se aplica aos médicos que praticam abortos. Se não o fazem pelo gosto da cirurgia, já tenho mais dúvidas que o não realizem pelo gosto do dinheiro: ninguém duvida que as clínicas abortistas não são precisamente deficitárias.

2) Curiosamente, o argumento funciona melhor se aplicado ao pai. Embora reconheça que nenhuma mulher se encaminhará de ânimo leve para uma sala de abortos, já não é tão certo que o pai da criança não encaminhe levianamente para lá a mãe da criança: “Engravidaste? Mais vale que abortes quanto antes”. É assim tão alheio ao que, infelizmente, assistimos com frequência?

Por outro lado, embora seja verdade que ninguém aborta por gosto, é preciso recordar – eis finalmente um argumento super-politicamente incorrecto! – uma pequena observação de G. K. Chesterton: “Ninguém se casa sonâmbulo nem gera filhos a dormir”. Assim, se é verdade que ninguém aborta por gosto, já não é tão certo que aos momentos da génese da nova criatura se possa aplicar levianamente a mesma descrição. A lei de despenalização do aborto é mais uma etapa na desresponsabilização, sobretudo masculina, das consequências dos actos sexuais livremente queridos. É como sugerir aos homens que sejam sexualmente irresponsáveis e fúteis, pois as mulheres serão “abortivamente” responsáveis e sensatas.

3) Por fim, acrescento que não consta que, nos países em que as leis penalizam os abortos, elas tenham sido alguma vez aplicadas levianamente e por gosto. Mesmo assim, desejam acabar com elas.

_____________

VEJA TODOS OS 4 ARTIGOS DESTA SÉRIE:

Parte 1: “Problema de consciência”?

Parte 2: “Crianças não queridas”?

Parte 3: É válido dizer “Ninguém aborta por gosto”?

Parte 4: “Aqui mando eu”?

_____________

SOBRE O AUTOR:

O Pe. João Paulo Pimentel é um sacerdote português a quem Aleteia agradece muito pela generosidade em contribuir para o site. Nesta série de 4 artigos, ele nos propõe reflexões de fundamental importância para a devida discussão sobre o aborto, refutando sofismas e argumentações inconsistentes dos defensores dessa prática infanticida.

Tags:
AbortoBebêsCultura do descarteIdeologiaVida
Apoiar a Aleteia

Se você está lendo este artigo, é exatamente graças a sua generosidade e a de muitas outras pessoas como você, que tornam possível o projeto de evangelização da Aleteia. Aqui estão alguns números:

  • 20 milhões de usuários no mundo leem a Aleteia.org todos os meses.
  • Aleteia é publicada diariamente em sete idiomas: inglês, francês,  italiano, espanhol, português, polonês e esloveno
  • Todo mês, nossos leitores acessam mais de 50 milhões de páginas na Aleteia.
  • 4 milhões de pessoas seguem a Aleteia nas redes sociais.
  • A cada mês, nós publicamos 2.450 artigos e cerca de 40 vídeos.
  • Todo esse trabalho é realizado por 60 pessoas que trabalham em tempo integral, além de aproximadamente 400 outros colaboradores (articulistas, jornalistas, tradutores, fotógrafos…).

Como você pode imaginar, por trás desses números há um grande esforço. Precisamos do seu apoio para que possamos continuar oferecendo este serviço de evangelização a todos, independentemente de onde eles moram ou do quanto possam pagar.

Apoie Aleteia a partir de apenas $ 1 - leva apenas um minuto. Obrigado!

PT300x250.gif
Oração do dia
Festividade do dia





Envie suas intenções de oração à nossa rede de mosteiros


Top 10
Ver mais
Boletim
Receba Aleteia todo dia