“Mas como você é lento(a)!” Isso deveria ser um elogio…
Diz-se “matar o tempo”. E refere-se ao tempo livre, àquelas horas – por vezes apenas minutos – que passamos sem o incómodo do trabalho, da família, das urgências sociais. Mas porque é que usamos um verbo tão negativo como “matar” para descrever uma experiência tão positiva?
É a partir desta observação que a nova edição da revista BenEsseresi explora o valor da lentidão na nossa era rápida, instantânea e instintiva. Num artigo de Caterina Allegro, com a colaboração da psicóloga clínica Maria Sperotto, começamos por tomar nota da sombra negativa que associamos espontaneamente a tudo o que é lento.
É também curioso notar que quando temos uma série de atividades – uma após outra, a um ritmo rápido – dizemos que otimizamos o nosso tempo. Com a ideia de que é ótimo correr, encher-se de afazeres e tarefas no mais curto espaço de tempo possível.
A Dra. Sperotto associa esta nossa atitude bem estabelecida à impressão de que o tempo é um recurso limitado e deve, portanto, ser explorado. A primeira parte do raciocínio é correta: somos criaturas limitadas – isto é, mortais – e o tempo à nossa disposição não é ilimitado. Podemos sentir a pressão negativa deste limite, ou olhar para ele através dos olhos de um agricultor a quem é confiada uma pequena horta. E se o tempo, em vez de ser explorado, deve ser cultivado?
Para apreciar o momento é preciso parar
O verbo desfrutar é perfeito para pintar um retrato dos tempos contemporâneos. Em vez de desfrutarmos, explorarmos. Aplaudimo-nos muito quando no nosso comportamento no trabalho diário somos bons em explorar o tempo e a oportunidade.
Aproveitamos o tempo para lhe arrancarmos cada segundo, sempre afoitos. Quantas vezes dizemos: eu fui muito bem, em meia hora fiz tudo! Ou, pelo contrário: perdi uma hora sem terminar nada.
Por que é que o tempo vivido, e dado a nós, deveria ser considerado perdido? Talvez porque os critérios utilitários nos pautam? É por isso que a Dra. Sperotto se refere à distinção feita pelos antigos gregos entre kronos (tempo como uma mera sucessão de minutos, horas) e kairos (o momento oportuno, ou seja, o tempo como uma oportunidade de significado). Com respeito a isto:
[…] o valor cronológico ocupa o segundo lugar em relação ao significado desse minuto para a nossa história individual.

A lentidão é uma conquista do nosso cérebro
Não é novidade encontrar conteúdos que valorizam a lentidão, no nosso mundo acelerado. A experiência do Slow Food, por exemplo, nasceu em 1986. Que o frenesi e a velocidade são responsáveis por uma certa corrosão da nossa humanidade, isso há muito que é conhecido.
Como diz Lamberto Maffei, antigo diretor do Instituto CNR de Neurociência, no seu In Praise of Slowness, e citado por BenEssere:
[…] o nosso cérebro é capaz de pensar rapidamente, conduzido pelo hemisfério direito, e de pensar lentamente, o que tem origem no esquerdo. A primeira forma é mais antiga: é aquela relacionada à sobrevivência, às reações instintivas e às imagens. A segundo, por outro lado, surgiu muito mais tarde, há apenas 100.000 anos, com a língua, e foi depois consolidada com a escrita.
Portanto, a velocidade é uma habilidade ligada à sobrevivência. Assim, é valiosa em situações de emergência, mas nem sempre. O impulso dado pela velocidade é grande quando nos faz correr para apanhar o nosso filho que está prestes a cair, mas não é tão grande quando nos ilude que podemos fazer tudo com um só clique.
Em suma, o pensamento rápido, que pode salvar a nossa vida em face do perigo, pode tornar-se uma ameaça à nossa própria sobrevivência quando nos leva a tomar decisões precipitadas sobre assuntos mais complexos. Por exemplo, comprar o último modelo de smartphone e ficar sem dinheiro para comprar alimentos.
A lentidão, em suma, é uma qualidade mais sofisticada, que o cérebro conquistou ao longo do tempo e produz contemplação e linguagem e todas as faculdades artísticas. A característica comum destas ações de pensamento é que elas pressupõem uma tomada de consciência. A herança consumista de que somos vítimas levou-nos a idolatrar a velocidade, talvez precisamente porque é melhor para o ser humano, reduzido a consumidor, manter a sua consciência desligada o máximo possível.
Não tenha medo do vazio
Quanta pressa, mas para onde vai? – diz uma famosa canção de Bennato. De fato, parar para compreender porque estamos com tanta pressa é uma coisa boa. E é bem verdade que o frenesi é muitas vezes uma reação ao medo de estarmos sozinhos e ainda, face a face com o nosso vazio.
Mas o horror vacui (horror do vazio) pode ser revertido ao se mergulhar nele.
A desaceleração nem sempre é possível, mas podemos decidir dar espaço às nossas emoções, mesmo negativas, em vez de as enterrar debaixo de pilhas de coisas para fazer.
Se aprendermos a ouvir-nos a nós próprios, mesmo em momentos de vazio, será mais fácil darmo-nos objetivos coerentes, contra os quais correr ou ficar parado faz sentido. Desta forma, mesmo aquele vazio de que tanto receamos, deixará de ser um poço sem fundo, mas sim um momento de passagem funcional para mudar.
O cristão, então, sabe que esse vazio é preenchido por uma presença. É um poço aparentemente sem fundo, mas do qual emerge o amor do Pai, que sempre sussurra e espera, pacientemente, toda a lentidão de que somos capazes. Espera por nós quando paramos.
Talvez a oração seja a melhor maneira de matar o tempo, ou seja, de matar os nossos apertados horários e habitar o vazio, acolhendo o sangue vital que só flui quando nos colocamos em relação com Aquele que nos criou.