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Novamente o aborto e a cultura da morte

Movimento pró-vida

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Francisco Borba Ribeiro Neto - publicado em 01/10/23

O aborto é uma manifestação da cultura da morte, não sua causa. Ele não gera essa cultura da morte, é gerado por ela

O contínuo avanço do aborto em nossas sociedades (permitido por lei em pelo mesmo 66 países e repetidamente invocado como direito em países como o nosso) nos obriga a uma séria reflexão sobre sua relação com a “cultura da morte”, denunciada por São João Paulo II na Evangelium vitae.

Uma cultura não se torna hegemônica apenas porque determina a mentalidade da maioria da população ou as normas seguidas pelo Estado. Ela, frequentemente, não corresponde à mentalidade da maioria. Em alguns casos, não se identifica nem mesmo com as posições oficiais do Estado. Uma cultura, se torna hegemônica à medida que condiciona a mentalidade da maioria dos formadores de opinião e dos tomadores de decisões (sejam agentes públicos ou privados). Nas sociedades contemporâneas, as mudanças começam justamente quando novas ideias, que são minoritárias entre a população e não tem representatividade junto ao poder político, começam a tornar-se hegemônicas. Por isso, temos que considerar que a cultura da morte, se não é hegemônica, pelo menos já é fortíssima no mundo de hoje.

O que caracteriza a cultura da morte?

O aborto é uma manifestação da cultura da morte, não sua causa. Ele não gera essa cultura da morte, é gerado por ela. Caso o enfrentemos como se fosse apenas uma tendência isolada e não o fruto de uma mentalidade que vai se consolidando, estaremos apenas “enxugando o gelo” e seremos, mais cedo ou mais tarde, superados pela onda que vai crescendo. Para ser efetiva, a luta contra o aborto tem que estar inserida numa batalha maior, contra a cultura da morte.

Essa cultura é caracterizada por um imediatismo desesperançado. Pode ser a perda de esperança atormentada, que leva ao desespero, daquelas pessoas que não veem nenhuma chance de serem minimamente felizes diante daquilo que lhes acontece. Pode ser uma desesperança fria e calculista, de quem se entregou a um pragmatismo cínico, para o qual todo ideal e todo afeto são ilusórios, e por isso o que resta é tentar controlar a vida, extraindo dela o máximo de prazer imediato. Num caso ou no outro, a morte é uma opção válida porque não existe um bom motivo para se sacrificar em nome da vida.

No caso de quem se vê realmente diante da opção de abortar, essa desesperança é acompanhada por um ocultamento da pessoa do nascituro. Fazemos muitas discussões conceituais sobre o direito do nascituro à vida, mas quem já encontrou pessoas que pensavam em abortar sabe que o problema não é teórico: elas simplesmente procuram não ver a criança que já está no útero. Não por acaso, uma das mais fortes e combatidas campanhas pró-vida consiste simplesmente em mostrar às mães imagens de como deve estar, naquele momento, a criança em seu ventre.

Recuperar a esperança

Bento XVI, respondendo a uma pergunta sobre as legislações pró-aborto, considerou que lhe parecia que “na base destas legislações haja por um lado um certo egoísmo e por outro uma dúvida sobre o futuro. E a Igreja responde sobretudo a estas dúvidas: a vida é bela, não é algo duvidoso, mas é um dom e também em condições difíceis a vida permanece sempre um dom. Portanto voltar a criar esta consciência da beleza do dom da vida. E depois, outra coisa, a dúvida do futuro: naturalmente há tantas ameaças no mundo, mas a fé dá-nos a certeza de que Deus é sempre mais forte e permanece presente na história e, portanto, podemos, com confiança, também dar a vida a novos seres humanos. Com a consciência de que a fé nos dá sobre a beleza da vida e sobre a presença providente de Deus no nosso futuro podemos resistir a estes medos que estão na base destas legislações”.

A cultura da morte é combatida justamente com essa consciência da beleza da vida, por meio do afeto que acolhe e mostra uma esperança onde antes só havia desespero ou cálculo individualista. Existe uma luta jurídica, absolutamente necessária, em defesa da vida. Contudo, temos que ter claro que a luta contra a cultura da morte deve transcender esse aspecto legislativo, deve ser também um trabalho formativo e um acompanhamento solidário que desperta para a confiança no amor, a beleza da vida e a esperança no futuro – pois todas essas três coisas faltam na cultura da morte e na opção pelo aborto.

Um caminho de justiça, mas também de solidariedade

Frequentemente, nossas campanhas pró-vida são interpretadas como se estivéssemos apenas culpando e penalizando as mulheres, fazendo com que elas se sintam menos amadas e respeitadas por causa disso. Precisamos aprender sempre mais a mostrar que a luta pró-vida é uma luta por amor tanto às crianças que estão por nascer quanto a suas mães. Uma mulher grávida, em dificuldade, deve descobrir-se amada por aqueles que lutam contra o aborto, ela e seu bebê devem receber o afeto e o apoio necessários para que ambos levem a vida para frente, para que a criança nasça e ambos, mãe e criança, experimentem a beleza da vida e do amor.

Não são apenas questões conceituais ou de um afeto abstrato, implicam em gestos concretos, apoios que podem ser psicológicos, familiares ou mesmo econômicos. Quando uma criança morre abortada, a responsabilidade raras vezes e só da mãe, quase sempre existe um conjunto de pessoas a levaram a isso ou deixaram de dar-lhe o apoio que lhe permitiria levar a gravidez à frente. Uns e outros, por empenho com o mal ou por omissão diante do bem, colaboram com a cultura da morte.

É natural e justo que nos sintamos indignados diante, por exemplo, do ativismo judicial que tenta legalizar o aborto no Brasil a qualquer custo. Contudo, a indignação deve levar ao compromisso, não à raiva. Quando olhamos o mundo com raiva dos abortistas e não com amor pelas vítimas do aborto (que são não só os filhos, mas também as mães que abortam por falta de apoio e orientação) reproduzimos a lógica do mal que gera o aborto e que deveríamos estar combatendo. O diabo ri contente quando vê os amigos de Deus olhando o mundo com os olhos da raiva e do ressentimento e não com os olhos do perdão e do amor. Quando isso acontece, ele (o diabo) sabe que já venceu uma batalha (que acontece em nosso coração e na sociedade).

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