Muito se tem estudado sobre os possíveis efeitos da oração na vida das pessoas. Mudanças comportamentais, alterações no humor, e até modificações estruturais do tecido neuronal já foram descritos em praticantes de determinadas atividades espirituais pela neurociência e por pesquisadores do mundo todo.
Neste contexto, a oração tem um papel de relevância quando se trata dos processos de adoecimento e cura, pois alguns estudos já apontam que muitos indivíduos entendem o adoecer e o seu respectivo tratamento como uma experiência espiritual (Do Spirituality and Medicine Go Together? | Bioethics (harvard.edu)). Estes estudos e evidências científicas levaram pesquisadores do mundo todo a estudar os efeitos da oração no processo de cura, investigando possíveis mudanças no desfecho das doenças comparando grupos de pacientes que possuem ou não práticas religiosas ou espirituais.
Os resultados destes estudos são algumas vezes divergentes e bem difíceis de serem analisados com rigor científico, devido às dificuldades na estruturação do estudo e por não haver um protocolo ou prática padronizada nos grupos que praticam as orações nas mais diferentes manifestações religiosas. Porém, mesmo com estas dificuldades, alguns achados são bem curiosos como, por exemplo, a ativação de regiões do cérebro (córtex pré-frontal e córtex cingulado), durante as atividades religiosas, que levam a estados emocionais específicos como a redução do estresse, da ansiedade, uma maior sensação de vinculação social, melhora da resiliência, entre outros
Contudo, os críticos destes estudos tentam justificar estes achados, creditando os resultados da oração ao efeito placebo.
Efeito placebo
O efeito placebo se dá quando um paciente, que não está recebendo nenhum tratamento médico ou farmacológico, acredita que está recebendo um tratamento real, e, desta forma, ocorrem reações neuroquímicas no organismo que levam à melhora dos sintomas e até a cura de determinadas doenças.
Esta ocorrência (efeito placebo) foi observada nos primeiros estudos para desenvolvimento de novos medicamentos. Na ocasião, os cientistas ofereciam para metade dos pacientes um comprimido com uma nova medicação para uma doença específica, e para outra metade, um comprimido idêntico, porém feito de farinha (sem qualquer efeito no organismo); nenhum dos dois grupos sabia se estaria tomando o medicamento ou a farinha. Surpreendentemente, alguns dos pacientes que recebiam a farinha apresentavam os efeitos da medicação que acreditava estar tomando.
O funcionamento do efeito placebo ainda não está muito bem compreendido, porém acredita-se que pode ser resultado de alguns fatores como a “Expectativa” e o “Condicionamento”; ou seja, a crença do paciente de que o tratamento será eficaz pode criar esperanças positivas, levando a um estado mental e emocional favorável, e, consequentemente, a uma resposta condicionada, culminando na cura da doença.
Essas expectativas podem liberar substâncias químicas no cérebro, como endorfinas e dopamina, que estão associadas ao bem-estar e alívio da dor etc. Outras possíveis explicações são a “Interação Social” e a “Confiança”, pois a confiança no profissional de saúde pode aumentar a crença do paciente no tratamento, potencializando o efeito placebo.
Fé
Ora, considerando que a fé é fonte de confiança e gera expectativas, estes pesquisadores céticos no campo religioso não estariam de todo errado ao creditar os resultados da oração ao efeito placebo, e, por isso, até hoje seus questionamentos são levados a sério exigindo dos pesquisadores mais rigor em seus estudos e pesquisas.
Como os cientistas conseguiriam afastar este fator de confusão? Os efeitos da oração são ou não resultados do efeito placebo? Para responder a estas questões, uma ideia de estudo foi proposta: avaliar os resultados da oração intercessória.
Diferentes estudos foram desenvolvidos avaliando pacientes de diversos hospitais tratados pelas mesmas doenças ou submetidos a procedimentos semelhantes (cirurgias, implantes de cateteres etc.). Os pacientes eram divididos entre aqueles que receberiam orações intercessórias de terceiros ou não as receberiam. Este fato minimizaria a interferência do efeito placebo, pois o paciente estaria, muitas vezes, em posição totalmente neutra ou passiva em relação ao seu tratamento (eventualmente a terapia ou o procedimento realizado no hospital exigia que o paciente estivesse em coma induzido ou em ventilação mecânica) o que não permitiria uma atitude mental positiva, muito menos a elaboração de expectativas ou condicionamentos.
Pesquisa
Uma interessante publicação na revista JAMA, feita pelo Dr. Willian S Harris, é um exemplo destes estudos. Foram avaliados mais de 900 pacientes de uma UTI Coronariana. Estes pacientes recebiam uma pontuação durante sua internação (referente às complicações, necessidade de procedimentos, intercorrências etc.), sendo que a metade recebeu orações intercessórias e a outra metade não (o detalhe interessante é que os pacientes não sabiam que estariam recebendo tais orações). Surpreendentemente o grupo que recebeu orações tinham pontuações significativamente melhores, sugerindo, inclusive, que a oração pode ser um recurso adicional complementando o tratamento médico padrão.
Muitos outros estudos foram publicados com resultados interessantes. Uma simples pesquisa nos buscadores com a expressão “Therapeutic effects of intercessor Prayer” é suficiente para nos fornecer algumas dezenas de estudos, com resultados que evidenciam desde efeitos claramente positivos e verificáveis da oração intercessória até resultados pouco ou nada conclusivos, dependendo da maneira com que a pesquisa foi estruturada.
Desta forma, podemos concluir que ainda é cedo para a ciência, com todo o seu rigor metodológico (e suas limitações para medir objetivamente efeitos e eventos subjetivos), dar uma resposta definitiva sobre a eficácia da oração. Todavia, os resultados observados nesses estudos permitem concluir que, em diversas situações, efeitos positivos são observados e estes efeitos não são meramente frutos do efeito placebo. Então, o final desta discussão continua na intimidade e na crença de cada um: aceitar e tomar posse de mais uma ferramenta (a oração) para auxiliar na experiência de enfrentar uma doença ou, então, meramente desprezar este recurso.