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“Deoversão” versus introversão: recolher-nos não em nós mesmos, mas em Deus

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Reprodução/CN

Reportagem local - publicado em 25/05/20

O silêncio pode ser um estado de “deoversão”: um movimento interior em direção a Deus, de profunda comunhão com Ele

Martín Ugarteche Fernández escreveu um texto no qual explica a diferença entre a introversão e um conceito que pode soar novo para muita gente: a “deoversão”.

O texto parte de um livro escrito pelo Padre Penido sobre o cardeal Newman, no qual, entre vários outros aspectos da personalidade do santo inglês, ele destaca a “deoversão”. Trata-se, à primeira vista, de uma “modalidade da introversão”, mas há notável diferença entre os dois conceitos: a introversão consiste em ficar ensimesmado, “voltado para dentro de si mesmo”, enquanto a “deoversão” é um voltar-se para Deus, é um movimento interior em direção a Ele, uma espécie de subida que se faz na experiência de comunhão com Ele.

Ambos os conceitos têm a ver com o silêncio, mas a “deoversão” envolve um silêncio muito mais profundo que a simples ausência de palavras: é a capacidade de estarmos atentos e guardar os fatos no coração, a exemplo de Maria, Mãe de Jesus e nossa.

O homem e a mulher silentes discernem quando é conveniente falar e quando é conveniente calar. O critério fundamental para este discernimento é a caridade. Às vezes, esse desejo pode responder a uma necessidade que temos de estar a sós com Deus, de ouvir com mais clareza a Sua voz, de deixar que a Sua Palavra acaricie e renove o nosso coração, depois de um momento muito intenso de atividade. Se este for o caso, não querer falar parece plenamente justificado e, inclusive, pode ser uma manifestação de um chamado especial que Deus nos faz neste momento particular da nossa vida.

A “deoversão” deveria ser uma experiência comum entre nós, cristãos, já que, desde o nosso Batismo, a Santíssima Trindade – Pai, Filho e Espírito Santo – habita em nosso coração. Ao fazermos um movimento de “introspecção”, de reentrar em nós mesmos, a nossa experiência deveria ser de profunda comunhão com Deus, que “é mais íntimo a mim do que eu mesmo”, como dizia Santo Agostinho.

Esta constatação de que a solidão não é o mais profundo em nós, já que fomos criados à imagem e semelhança de Deus e fomos feitos partícipes do amor trinitário por meio do nosso Batismo, também está presente numa das obras literárias de Karol Wojtyla, que depois veio a se tornar o Papa São João Paulo II: referimo-nos à sua obra teatral “Raio de paternidade”:

“Não me fizestes como um ser fechado, não me fechastes totalmente. A solidão não está, de fato, no mais profundo do meu ser, mas emerge num ponto bem preciso”.

Muitas vezes, em nossa vida, a resposta mais adequada às situações e pessoas com as quais lidamos é realmente a de calar, a de rezar e pedir a Deus alguma luz, antes de dizer ou fazer alguma coisa concreta. Isto não significa isolamento, mas reverência e constatação de que precisamos da ajuda de Deus para sermos de ajuda aos outros. Pode ser que, em algumas situações, realmente Deus nos peça a nossa intervenção, inclusive através de uma correção fraterna. Os mestres espirituais dizem que isto nunca deve ser feito em momentos de ira ou exaltação, mas quando estamos tranquilos. A outra pessoa deve perceber que a nossa intenção é realmente ajudar. Mesmo assim, a nossa correção pode não ser bem aceita num primeiro momento. Isso foi previsto por Nosso Senhor, quando explicou aos Seus discípulos como devia ser feita a correção numa comunidade cristã (Cf. Mt 18,15-18).

O máximo exemplo de silêncio nos vem do Senhor Jesus. Basta uma leitura atenta da Sua Paixão para percebermos como o Senhor escolhe os momentos para calar e falar, sempre visando a salvação de todos, inclusive daqueles que O crucificaram.

Depois d’Ele, a nossa Mãe, Santa Maria, nos oferece um elevado exemplo de silêncio. São pouquíssimas as suas palavras nos Evangelhos, sempre reverentes e em sintonia com a vontade de Deus. Talvez um dos momentos mais emblemáticos seja o das Bodas de Caná, passagem que é uma verdadeira escola de silêncio e de intimidade com Seu Filho, manifestada em gestos e palavras. O que a leva a intervir, a pedir o milagre, é a preocupação com os noivos, própria de quem é mãe e intercessora em favor de todos os homens e mulheres.

Peçamos a Ela que nos ajude a viver o silêncio, a saber quando falar e quando calar, para que tanto a fala quanto o silêncio sejam em nós uma concretização do amor, como o foram na vida dela.

A partir de texto de Martín Ugarteche Fernández, via A12


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