Depois do amor romântico, quantos temas renderam mais histórias à literatura e ao cinema que os dramas familiares?
Para muita gente, a grande decepção do Oscar 2022 foi o prêmio de melhor filme ter ido para “No Ritmo do Coração”, sobre uma família de surdos, ao invés de “Ataque dos Cães”, sobre os conflitos entre um fazendeiro violento, com tendências homossexuais reprimidas, e a nova esposa do seu irmão, com um filho adolescente. As premiações do Oscar não refletem objetivamente o nível artístico de uma obra, dependem de fatores que vão do gosto médio dos votantes na premiação ao poder econômico e político dos estúdios. O crítico de cinema de um grande jornal brasileiro, fazendo eco ao que muita gente deve ter pensado, escreveu que a vitória do melodrama sobre a família de surdos em detrimento do filme que retratava um “cowboy gay”, mostra, na Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, “o poderio de seus membros mais tradicionais — isto é, homens brancos, velhos e heterossexuais”.
Pode até ser verdade, mas não deixa de também ser verdade que no Oscar 2022 os dramas (fictícios ou reais) de famílias ocuparam uma posição central. Longe das polêmicas, o ganhador de melhor animação, “Encanto”, também versava sobre os problemas de uma família colombiana extensa (aquela que inclui avós, tios, primos). “Ataque dos Cães” não deixava de ser um filme sobre famílias e os traumas que acontecem dentro delas. O filme que levou o Oscar de melhor ator, “King Richard”, narrava a história do pai das campeãs de tênis Serena e Vênus Willians. O melhor roteiro foi para “Belfast”, reminiscências da infância e da vida familiar de Kenneth Branagh, numa cidade convulsionada por conflitos sociais. No maior acontecimento da noite, o ator Will Smith estapeou o apresentador Cris Rock, por uma piada que considerou ofensiva a sua esposa. Logo depois, declarou “estou parecendo o pai doido […] mas o amor leva você a fazer coisas loucas”… Independentemente do erro de seu ato violento, foi aplaudido (pela declaração de amor à esposa, não pelo gesto agressivo contra o apresentador– é bom termos claro).